26 de fevereiro de 2023

Primeira Impressão

Desire, I Want To Turn Into You
Caroline Polachek





O segundo álbum da carreira da Caroline Polachek é facilmente um dos trabalhos pop mais excitantes dos últimos tempos, ajudando a colocar a artista no posto de maior diva pop alternativa da atualidade. Infelizmente, Desire, I Want To Turn Into You é um álbum que não alcança na minha visão todo a vastidão do potencial da sua sonoridade.

É necessário explicar que essa sensação é algo bastante pessoal, pois as críticas que irei fazer é sobre a minha conexão cheia de altos e baixos com o resultado do álbum. Obviamente, toda resenha de um crítico ou um amador apaixonado assim como quem escreve essas linhas vem de um lugar de íntimo, único e parcial de visão sobre o que faz ou não um álbum ser digno de elogios ou merecedor de críticas. Entretanto, é preciso explicar aqui que o meu não gostar plenamente de Desire, I Want To Turn Into You é devido ao fato de não ter conectado de forma direta com todo o espetáculo que Polachek proporciona. Não sei exatamente se acho que o resultado soa levemente distante emocionalmente do que esperava ter, especialmente devido a incrível lírica apresentada em todas as canções. Ou talvez seja o fato de achar uma certa pretensiosidade vinda da produção da própria em querer quase insistentemente fazer do pop algo arte misturado com um verniz intelectual. Apesar dessas minhas reservas, não consigo deixar de apontar com firmeza que Desire, I Want To Turn Into You é um deslumbre sonoro desde os primeiros acordos até o apoteótico final.

Analisando com cuidado chego a conclusão que as minhas ressalvas são afogadas pela impressionante, grandiosa e ousada construção da produção capitaneado pela própria Polachek ao lado de Danny L Harle. E, queridos leitores, a imensidão da qualidade inserida em toda a duração do álbum é algo realmente desconcertante, pois todo na cartilha do indie/alternativo pop é adicionado para depois de ser distorcido e reconstruído ao bel prazer da produção, sendo adicionado camadas, texturas, sons, misturas, quebras e cores que o transforma jornada pop como poucas. E essa toda complexidade é “disfarçada” por uma pegada mais contida já que as canções seguem um caminho contido e, às vezes, minimalista devido as construções instrumentais. Devido a isso, o álbum é como um assassino silencio que vai entregado aos poucos no consciente pop para que depois de absorvido é finalmente mostrado a sua beleza artística.

Se tivesse que denominar qual o gênero de Desire, I Want To Turn Into You seria o do art pop, mas isso é fácil de contradizer devido as altas doses de outros estilos que permeiam, recheiam e elevam o resultado final. Cada canção parece como um novo mundo de descobertas que se inicia que se conecta com o resto do álbum com a mesma elegância que se torna algo completamente isolado. Essa qualidade dá para o álbum um fator imprevisível que nuca deixa de realmente surpreender a toda nova curva. E um dos momentos que melhor em encapsula essa qualidade é a incrível Sunset “uma estranha, excitante e envolvente dentro dos seus termos mistura de flamenco pop com art pop que conquista exatamente pelas suas inesperadas decisões sonoras. Coproduzido por Sega Bodega, a canção é a prima distante do que La Isla Bonita da Madonna com toda a atmosfera que trouxe a Rosalía, adicionado a personalidade de Caroline de forma a não dar espaço para quem ouve de não associar a canção como um trabalho da sua autoria”. Já em Billions, “uma mistura completamente única de art pop, indie pop, trip pop e synthpop”, Polachek “apresenta uma construção sonora extremamente distinta, intricada, rica, inesperada e de uma inteligência única. Texturas, sons, nuances e quebras de expectativas fazem parte da base do impressionante arranjo que consegue ser, ao mesmo tempo e de maneira impressionante, contido e grandioso em um equilíbrio impressionante”. Apesar de toda a qualidade sonora, Desire, I Want To Turn Into You tem na estonteante presença de Caroline Polachek o seu farol de guia.

Não apenas a presença carismática e bastante única, a cantora é dona de uma voz espetacular com uma versatilidade imensa e um alcance impressionante. Essa presença é o que parece que dá a liga para que todos os elementos se juntem de forma pretendida incialmente. E um exemplo disso é em Bunny Is a Rider em que “parece que em alguns momentos os vocais não irão se encaixar na canção, outros soando perfeitamente alinhados e outros adicionando efeitos que parecem exageros, Polachek consegue encontrar o equilíbrio certo e adicionar uma dose cavalar de personalidade sem precisar necessariamente de entrega vocais arrebatadores”. Entretanto, o grande momento para a performance da cantora é também no melhor momento do álbum na magistral Butterfly Net. Uma balada indie pop emocionante, a canção mostra todo o magistral potencial de Polachek ao entoar com uma elegância intocável uma lidíssima e triste composição que tem o seu momento sublime no refrão:

Lá estava você
Com seu espelho
Brilhando o mundo sobre mim
Lá estava eu
Com minha rede de borboletas
Tentando capturar seu brilho

Outros momentos merecedores de destaques é calmaria selvagem de Crude Drawing of an Angel, a brilho sombrio e tremeluzente da eletropop/indie I Believe, a parceria com a Grimes e a Dido em Fly to You em que as personalidades das envolvidas se fundem em um trabalho inspirado, a elétrica e sensual indie pop/folk Blood And Butter e, por fim, Welcome to My Island ao ser “inusitada e madura synth-pop com toques de eletrônico e pop rock que apenas uma artista tão única como Polachek poderia pensar em entregar”. Desire, I Want To Turn Into You é um tipo de trabalho que deve envelhecer como vinho e deve tirar certas ressalvas minhas que tenho. E o resultado do álbum irá ajudar a catapultar a carreira da Caroline Polachek para o seu merece próximo nível.


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