Mac Miller
Álbuns póstumos são sempre trabalhos complicados, pois normalmente o caminho seguido é uma mistura de caça niqueis barato com um apelo emocional de quinta e sem vergonha. Entretanto, de tempos em tempos surge um trabalho como esse que ultrapassa essas percepções para entregar um trabalho que realmente faça jus ao talento de quem partiu. E mais raramente, o álbum mostra com exatidão o que poderia ter sido. Esse é o caso do ótimo e emocionante Balloonerism do rapper Mac Miller.
Sétimo álbum do rapper e segundo póstumo, o trabalho é um imenso atestado sobre o imenso potencial do artista que foi interrompido devido a sua morte em 2018. O grande trunfo desse álbum é que o mesmo tinha sido gravado na sua totalidade e completude em 2014, mas, possivelmente, não tinha sido aprovado para lançar devido a gravadora não o achar comercial ou algo parecido. E isso faz com que Balloonerism seja um trabalho totalmente com a visão de Mac e, não, uma colcha de retalhos que precisou ser juntada para fazer algum sentido. O álbum faz sentido porque foi pensando dessa maneira já que todas suas faixas foram produzidas por Mac, deixando para alguns colaboradores como, por exemplo, Thundercat, Taylor Graves, entre outros, preencher algumas lacunas e trabalhar na sua finalização. Devido a isso, o álbum ganha essa força verdadeira e pungente de que estamos diante de um trabalho original e refrescante, mesmo que tenha demorado onze anos para ver a luz do dia. Apesar dessa gratificante sensação, o álbum também tem uma forte sensação de tristeza, pois o que ouvimos aqui é um artista no caminho da genialidade que foi impedido pela sua trágica morte, não tendo tempo para se desenvolver totalmente e, principalmente, não teve tempo de ver suas flores sendo entregues pelo público e pela crítica. E isso é realmente devastador. Felizmente, Balloonerism é um trabalho que ultrapassa esses sentimentos ao ser um trabalho realmente preciso e de qualidade.
A melhor definição para o álbum seria jazz rap/experimental, pois Mac pegou essas três vertentes para criar uma refinadíssima, madura, magnética, ousada e deslumbrante sonoridade que é alimentada de vários outros gêneros como, por exemplo, neo-soul, neo-psychedelia, R&B alternativo e hip hop, criando um trabalho que vai se desenrolando em camadas inspiradas e de um conteúdo denso e lindamente instrumentado. Na verdade, Balloonerism se eleva devido ao trabalho de construção técnica, pois é dessa impressionante condução que vem a base forte e incrementada capaz de sustentar perfeitamente todo o peso das decisões sonoras da produção. E não existe nenhum momento que o instrumental seja apenas bom, pois, até mesmo nas faixas menos impactante sonoramente, é possível ouvir o cuidado do lado técnico do começo ao fim. Quando esse lado está no seu ápice, o resultado é impressionante como é na marcante Do You Have A Destination?. Uma abstract rap com toques dourados de neo-soul, a canção tem um trabalho realmente de tirar o fôlego na criação do seu inspirado e dinâmico arranjo que a faz deixar bem claro a mentalidade criativa de Mac de maneira limpa e direta. Isso é o que a canção realmente precisa para ser a base forte suficiente para sustentar a sua composição devastadora que ganha camadas e camadas de significância devido a morte do rapper. Refletindo sobre qual é o seu destino na vida, Mac reflete sobre fama, vida e morte de uma forma que ao mesmo tempo deixa a gente ciente da mentalidade única do rapper na época e, ao mesmo tempo, reflete o que aconteceria com ele alguns anos depois. Em um dos versos, Mac parece “prever” o futuro ao abrir a canção dizendo “Okay, I went to sleep faded, then I woke up invisible”, fazendo uma relação de ter uma overdose e não mais acordar. E o rapper continua a refletir sobre assuntos fortes ao longo do álbum, deixando claro a sua honestidade sobre seus problemas e como era sua visão da vida.
Honesto, poético e desconcertante, Mac apresenta aqui uma lírica que, apesar de ainda precisaria de certas aparadas de pontas, o levaria para o topo entre os maiores compositores do rap/hip hop ao longo dos anos. Mesmo assim, o rapper foi capaz de entregar crônicas complexas sobre a vida como é o caso de Rick’s Piano em que apesar de se perguntar como a morte seria, a composição também tem traços de esperanças e da vontade de ter um futuro. Outro grande momento lírico é em Stoned que mostra a sua visão sobre uma namorada e os seus problemas. Em nenhum momento, o rapper a transforma em uma vilã, mas, sim, mostra uma pessoa falha que precisa de carinho e amor. É tocante e, ao mesmo tempo, devastadora. Em questão de performance, Mac tinha uma capacidade interessante de despejar emoção verdadeira, mostrar versatilidade e um flow sólido sem precisar mudar drasticamente a sua personalidade em que suas performances sempre mostram um rapper despretensioso e quase informal como mostra o iluminado single 5 Dollar Pony Rides. Outros momentos que precisam ser citados são a estilosa Friendly Hallucinations e a delicada Funny Papers. Balloonerism é um trabalho que faz jus a memória do Mac Miller, pois é uma obra que realmente veio do talento do rapper e que, apesar do verniz de tristeza, fico realmente contente de finalmente ser colocado a luz do dia para o público.
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