26 de maio de 2020

Primeira Impressão

Song for Our Daughter
Laura Marling


Depois de ouvir um álbum tão violento sonoramente como Fetch The Bolt Cutters, a questão que ficou na minha cabeça foi em saber como iria analisar outro álbum sem ter resquícios pungentes que poderiam atrapalhar a minha percepção? Felizmente, o antidoto foi a doce melancolia de Song for Our Daughter da britânica Laura Marling.

Assim como o álbum de Fiona Apple, Song for Our Daughter não é um trabalho para qualquer um, mas por motivos bem diferentes. A razão aqui é devido a cantora caminhar em uma trilha folk/indie, gêneros esses que não tem tanta aceitação pelo grande público. Outro motivo é que o álbum resulta em uma atmosfera melancólica e contemplativa no instante que Laura começa a explorar sonoramente e tematicamente reflexos sobre a vida e o amor não sendo recomendado para aqueles que não querer se emocionar em tempos tão sombrios como o que vivemos. Tirando esses pequenos empecilhos, o álbum é uma verdadeira pequena grande obra.

Delicado, melódico, contido e com uma produção que prefere constantemente trabalhar a simplicidade instrumental, Song for Our Daughter é o que pode ser chamado de slow burn. Começando devagar e aumentando aos poucos a sua força, o álbum só chega ao seu ápice na sua parte final em que, dentro das suas características sonoras, explode emocionalmente em dois momentos impressionantes: a country/folk Hope We Meet Again e as suas lembranças amargas de uma história de amor e a devastadora The End of the Affair sobre o fim de um romance e as suas consequências. Dona de uma lirica poética, direta e simples, Laura tem aquela qualidade de contadora de história que está em falta atualmente. E, queridos amigos, as histórias que a mesma conta são de uma profundidade e elegância tão refinados que fica difícil não se emocionar e se envolver a cada verso. Devido a essa qualidade de ir desembrulhando as emoções aos pouco, Song for Our Daughter tem um começo não tão inspirado quanto a sua parte final, gerando uma certa barreira para quem começa a escutar o álbum, não tendo tanta familiaridade com a artista ou/e gênero. Passando esse começo, o público é presenteado com um trabalho inteligente e impressionante dentro de um escopo relativamente pequeno. Além das canções já citadas, outros momentos de destaque ficam por contada da confortante Only the Strong, a tocante homenagem para Paul McCartney em Blow By Blow e a canção que dá nome ao álbum Song for Our Daughter em que Laura, assim como em todo o álbum, escreve pensando em um filha fictícia. Ouvir esse álbum foi como um verdadeiro detox sonoro para uma mente ainda em espiral. E acredito que Song for Our Daughter pode servir para aqueles que querem desintoxicar desses tempos em que vivemos.

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