Liniker
Não posso afirmar que Caju, segundo álbum da carreira da Liniker é um excepcional álbum pop brasileiro, pois, na verdade, o trabalho é um excepcional álbum e ponto final. Em mais de uma hora e pouco, a cantora entrega um dos trabalhos mais sensíveis e marcantes do ano ao expor seu coração e alma em uma jornada inesquecível.
Fugindo completamente da tendencia de entregar um trabalho raso e rasteiro, Caju é um complexo, épico, intricado, elegante, maduro, inspirado e deslumbrante de uma mistura edificante e brilhante de MPB, soul, R&B e pop que faz a gente realmente ficar de queixo caído ao notar o tamanho da força artística e emocional que existe na produção. Não é uma surpresa nenhuma notar que esse produto final veio da Liniker, pois seus antecedentes mostram bem claro a sua capacidade e, principalmente, seu imenso senso estético e criativo. Entretanto, Caju parece elevar em um novo patamar toda a sua genialidade devido ao refinamento em estado de graça da produção a sua volta e, claro, da sua própria visão. E nada mais certo que essa elevação seja não apenas refletida na produção do álbum, mas como também no instrumental de maior valor para a cantora: a sua voz.
Em Caju, Liniker em está em estado de graça vocalmente. Na verdade, mesmo com toda a qualidade da produção, o álbum não seria de longe a mesma coisa se não tivesse a dona que tem em tamanho brilhantismo vocal. Viva, melancólica, sensual, delicada, emotiva, graciosa, poderosa e acachapante. Conseguir achar todos os adjetivos para qualificar todas as performances da Liniker é um pouco complicado, pois a cantora consegue abranger todas e bem mais devido todas as magistrais interpretações que a mesma entrega em cada nova canção. Completamente dona de si e do com uma sabedoria incrível sobre com usa o seu lindíssimo timbre e sua potencial rara, Liniker encontra os céus no melhor momento do álbum: a genial Veludo Marrom.
Uma impecável e apoteótica power balada soul/MPB com toques de gospel, a canção apresenta a cantora em uma atuação simplesmente inesquecível que começa delica e suave para ir crescendo através de camadas de significação para finalmente terminar de maneira apoteótica e poética em um dos momentos mais belos e emocionantes de todo álbum, ajudando a canção a se tornar uma das melhores canções nacionais dos últimos tempos. A produção realiza um trabalho magistral ao construir toda a atmosfera da canção, mas preciso apontar o quanto importante é o impressionante trabalho instrumental que teve parceria com a Orquestra Jazz Sinfônica. É desse cuidado meticuloso da produção que Caju tira toda a sua base para poder desfilar com classe toda a sua impressionante sonoridade que, mesmo sem atingir o altíssimo nível de Veludo Marrom, consegue planar altíssimo durante todo o trabalho.
Sem sair exatamente da trajetória sonora que se propõe, Caju mostra a versatilidade da Liniker ao explorar ritmos e gêneros diferentes que vão sendo pincelados ao longo da duração do trabalho. E um dos melhores desses momentos é a pop soul/rock Popstar. Mesmo não tendo nada que possa ligar a mesma com o mainstream atual do pop brasileiro, a canção é um trabalho essencialmente pop que deixa a gente extasiado com a batida envolvente e deliciosamente cativante. Logo em seguida, a cantora embarca com classe e pompa em outra ótima excursão de gênero no gostoso pagode Febre que ganha uma versão solo e de estúdio depois de ter sido gravada pela cantora e o Thiaguinho. O grande trunfo da canção é, além de fazer o gênero jus de maneira respeitosa, a composição da canção inteligente e muito bem construída que eleva o trabalho. E é esse outro detalhe importante para o sucesso de Caju.
Intimo, inteligente e refinadíssimo, as letras que compõem o álbum são crônicas inspiradas que retratam os sentimentos, emoções e vivencias da cantora, especialmente no campo amoroso. E a capacidade artística da Liniker ao lado de seus colabores é edificante e uma inteligência única, pois mostra o quanto poderoso pode ser uma composição em português quando tratada da maneira correta e não sendo um arremedo de letra que tenta seguir tendencias apenas para viralizar. Existe alma, corpo e um coração imenso por trás de cada letra, deixando a impressão que estamos diante dos diários da cantora em que ela relata seus pensamentos mais preciosos, pessoais e profundos. Logo de cara, o álbum já entrega perfeitamente toda a sua capacidade lírica e temática com a deslumbrante faixa que dá nome ao álbum: Caju. A canção expõe os medos e receios da cantora ao se questionar sobre se vale a pena se entregar para um novo amor. Sincera, poética e tocante, a canção mostra a vulnerabilidade de Liniker e, ao mesmo tempo, a sua força emocional. E acho em especial esses versos simplesmente devastadores:
Será que você sabe que no fundo eu tenho medo
De correr sozinha e nunca alcançar?
Eu me encho de esperança de algo novo que aconteça
Quem despetala a rosa estará lá pro que aconteça?
Apesar de reinar plenamente durante todo o álbum, Liniker é acompanhada de algumas participações especiais que apenas fazem aumentar o prestigio e o estofo artístico do álbum. A melhor delas é na deslumbrante jazz pop/MPB Ao Teu Lado que tem a presença delicada de Anavitória e o piano transcendental do músico Amaro Freitas. Outro momento de convidado inspirado é na deliciosa e nostálgica disco/soul Deixa Estar com a presença do Lulu Santos e, também, da Pabllo Vittar que poderia até ter mais presença. Outros momentos de destaque do álbum ficam por conta latinidade inspirada de Negona dos Olhos Terríveis, a sensual e aveludada Papo de Ededrom com a presença da novata Melly, o dueto cativante com a Priscila Senna em Pote de Ouro e, por fim, na dançante So Special. Caju já pode ser considerado um dos marcos da recente história da musica brasileira, consolidando a Liniker como uma das nossas melhores artistas contemporâneas. E isso é o lugar de merecimento para tamanho talento.
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