Sampha
O segundo álbum cantor/produtor Sampha é, ao mesmo tempo, uma aventura experimental de sons e sensações e um trabalho palatável para um público que não necessariamente ouviria esse tipo de trabalho. E isso, querido leitores, é algo tão incrível e impressionante, pois Lahai não perde em nenhum segundo a sua capacidade artística impressionante.
Acredito que a razão para o artista alcançar esse lugar é nunca fazer do álbum algo que precise fazer quem escutar refletir profundamente sobre o que está sendo apresentado, mas, na verdade, a intenção é fazer a gente sentir cada batida na pele como a brisa de um fim de tarde no verão. A gente pode até pensar em como, por exemplo, o vento se forma ou como a pela capta a sensação e manda para o cérebro decodificar, mas na maioria esmagadora das vezes a gente apenas sente. E nada mais. Assim foi como escutei Lahai, deixando as sensações serem o ponto alto e não as explicações. E que experiência é poder sentar e sentir a cacofonia controlada, requintada, solar e excitante que a sonoridade criada para o álbum.
Produzido por Sampha com coprodução do espanhol el Guincho e Ricky Damian, Lahai é um revigorante, inteligente, delicado, atemporal e marcante trabalho de alternative R&B/eletrônico que rabiscado por uma gama impressionantes de influencias de uk garage, neo soul, art pop e acid jazz que cria um brilhante, efervescente e coesa coleção de canções que apesar de intrigadas são de uma facilidade em escutar. E isso é mérito da produção que consegue ser extremamente rica e de uma complexidade sonora pungente, mas que não sua superfície soa como um álbum pop comercial. Isso seria um problema enorme para um álbum que não é pop comercial, mas para Lahai é uma verdadeiro trunfo gigantesco já que o processo de ouvir seus cerca de quarenta minutos é tão gostoso que a gente quer colocar na repetição várias vezes sem parar, criando uma conexão duradora e envolvente. E isso não é apenas a única qualidade do álbum.
A instrumentalização construída para o álbum é genial. Não há como classificar de outro maneira o homérico trabalho realizado, mas a sensação de não parecer algo tão complexo continua exercendo a sua força. Ao prestar atenção, porém, é fácil notar a profundidade grandiosidade que a produção vai adicionando na parte técnica para expressar toda a força temática. Liricamente, existe uma densidade delicada nas letras que é emocional sem precisar ser pesar para o dramalhão. Inteligente sem soar pretencioso. Simples, mas nunca simplista. Denso em sentimentos, porém, leve em significação. Por exemplo, a sensacional Suspended é sobre ser salvo do caminho de destruição pelo amor que consegue ser sintetizado em três tocantes versos do refrão: “Suspended/ I've been lifted by her love/ I fell lifted from above”. E Sampha poderia facilmente cair nesse lugar e ainda assim ganhar um passe livre, mas isso não acontece em Lahai. Em Jonathan L. Seagull, o cantor usa a mensagem do livro Jonathan Livingston Seagull (Fernão Capelo Gaivota em português) para falar sobre a conquista da nossa individualidade e o entendimento que cada um tem o seu caminho. Todavia, o álbum encontra o seu ápice na genial Spirit 2.0 em “uma jornada incandescente que vai se desaguando em uma rica, impressionante, genial, envolvente e iluminada mistura de eletrônico, neo-soul e R&B alternativo que é como sentir o Sol depois de messes de escuridão. Sexy, romântica, sensual, vibrante e acolhedora, a batida da canção é um dos trabalhos mais impressionantes que escutei em muito tempo ao ser linear sem nenhum grande arrombo, mas vai sendo adicionada uma dose cavalar de nuances que a vai elevando em patamares cada vez mais altos. É como uma comida com vários temperos que vai sendo revelados ao longo da experiência de saborear cada mordida inesperada e, ao mesmo tempo, tão familiar”. A canção também ressalta a capacidade vocal do artista “que busca referencias de cantores “tradicionais” para compor sua belíssima e revigorante interpretação, existe dois momentos nos versos que antecedem o refrão que é de derreter gelo glacial”. Completando o círculo de grandes momentos está na estilizada Dancing Circles e a inspiradíssima Only. Tenho que admitir que a parte final do álbum perde um pouco do folego construído, mas isso não é um tropeço que chega a arranhar seriamente o resultado final. Assim sendo, Lahai é o tipo de trabalho que precisa escutado como um todo, pois o que Sampha faz aqui é realmente extraordinário em todos os sentidos.
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