Kamasi Washington
Fearless Movement, quinto álbum da carreira do saxofonista Kamasi Washington, é um deslumbre criativo que arrebata quem escuta para uma das jornadas mais espetaculares dos últimos tempos. E apesar de já esperar tamanha qualidade devido ao lançamento inspirados dos singles, o álbum ainda guarda preciosas surpresas que o ajuda a se tornar o melhor trabalho de 2024.
É preciso dizer que o álbum não é um trabalho para todos os públicos, mas tenho certeza que se você tiver a ideia de gostar de música boa seja qual for o estilo ou gênero irá com certeza encontrar várias coisas para adorar o álbum. E o maior ponto para adoração é o impressionante e genial trabalho de instrumentalização. Parece obvio que um artista que é um instrumentalista teria como ponto alto os arranjos no seu álbum, mas Washington vai muito além para entregar um verdadeiro deleite transcendental para os ouvidos ao construir uma rede complexa, refinadíssima, surpreendente, rica, intricada e magistral de construções instrumentais. Em quase uma hora e meia de álbum, o artista é apoiado por uma coleção genial de colaboradores que contribuem de maneira incontestado para a elaboração de cada faixa em que tudo soa como uma grande onda de som e, ao mesmo tempo, a gente consegue perceber a importância de cada instrumento para a definição e lapidação da sonoridade impressionante de Fearless Movement. Nas mãos de uma pessoa menos capacidade para comandar, o álbum teria sido esmagado pela própria imensidão da sua sonoridade em que seria perdido facilmente o foco e iria terminar como uma grande decepção. E isso é algo que passa muito, mais muito longe do que é ouvido no álbum em todos os momentos.
De maneira bem geral, Fearless Movement é um trabalho de jazz que percorre caminhos experimentais para entrega a sua épica e imponente sonoridade. Todavia, o fato é que estamos diante de algo bem mais complexo, pois Washington injeta uma gama imensa de outros gêneros para criar a sonoridade do álbum indo do rap, psicodelia e hip hop, passando soul, funk e R&B e chegando até a subgêneros do jazz como jazz fusion e spiritual jazz. Apesar de tamanha ambição, a produção comandada pelo artista com auxilio em algumas faixas de nomes como André 3000, J the Chicago Kid e Miles Mosley, consegue perfeitamente administrar o equilíbrio entre o proposto e o entregue ao meticulosamente estabelecer um fio condutor desde os primeiros segundos até o ultimo momento que faz quem escuta entender o fio da meada dessa monstruosidade sonora. Somos arrebatados pela grandiosidade do álbum, mas nunca perdermos o foco sobre o que estamos ouvindo. E boa parte disso vem a genialidade técnica por trás dos arranjos, mas, também, da maneira sempre sóbria que Fearless Movement é conduzido. Sóbria, mas nunca densa já que o trabalho é claramente uma celebração.
Outro ponto importantíssimo para o sucesso do álbum é o fato que o trabalho é vibrante, elétrico e explosivo de uma maneira solar que vai transitando entre o dançante, inspirador e radiante. Acredito que seu o trabalho fosse mais melancólico e denso no sentido emocional é provável que poderia terminar sendo pesado demais para o seu tamanho de duração e tamanho artístico. Isso não seria exatamente um problema, pois acho que o imenso talento de Kamasi seria capaz de encontrar saídas para aliviar essa sensação. Só que com o resultado que temos fica fácil notar que essa decisão de celebração para a sua atmosfera é o ponto que faz o álbum dá aquele passo para a genialidade pura. E um outro detalhe que dá ainda mais força para Fearless Movement são as suas inspiradas e espetaculares participações especiais.
Mesmo sendo um álbum focado na parte instrumental e na atmosfera sonora, o álbum conta com algumas participações sensacionais de uma gama de artistas que apenas aumentam o poder das faixas que participam. Um exemplo perfeito disso e, também, de tudo que vem falando é a genial Asha the First. Uma inesquecível e reverberante faixa que destaca perfeitamente o poder instrumental criado para o álbum, a canção ainda conta com os vocais de Thundercat e Ras Austin e um verso extraordinário e épico do rapper Taj Austin que consegue a proeza de elevar o que já era perfeito para outro patamar. Na contra partida, Kamasi Washington mostra o seu poder de maneira solo ao comandar ao magistral Prologue ao ser “uma explosão sonora que faz a gente ser catapultado para uma outra dimensão devido a magistral construção instrumental e transcendental estrutura atmosférica. Sem ter medo de começa a canção já a 100km por hora, Washington já impacta quem ouve com o seu magistral sax em torrente continua e desorientante que vai conduzindo todo o resto do espetacular arranjo. E quando a gente acha que a canção não tem mais para onde ir, Prologue vai se desenrolando no seu terço final como um quase maremoto sonoro em uma explosão de tirar o folego e misturar todas as nossas sensações de forma inesquecível”. Na bela e romântica Computer Love, a impressionante ambientação sonora ajuda a refletir sobre o amor na modernidade com uma performance devastadora da cantora Patrice Quinn. The Garden Path “é o triunfo de uma instrumentalização genial. Explosiva, mas sem perder a ternura. Sufocante, mas nunca sendo exageradamente frenética. Belíssima, mas apresentando uma fúria selvagem. Contemplativa e, ao mesmo tempo, sabendo exatamente o que é do começo ao fim. A canção é essa dualidade de informações, mas que nunca se perder devido ao pulso firme da produção. E o solo de sax de Kamasi é algo realmente triunfal e poderoso como a fúria de vendável”. A beleza da construção de Interstellar Peace (The Last Stance) poderia facilmente fazer parte de uma premiada e cultuada trilha sonora de um filme clássico de ficção cientifica. E, por fim, o álbum começa de maneira devastadora com a gloria espiritual Lesanu. Facilmente um dos álbuns a estar entre os melhores de 2024, Fearless Movement é um dos marcos artísticos que devem ser celebrados em toda a sua magnitude do talento de um gênio como é Kamasi Washington.
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