Laufey
Acredito que já tenha apontado várias vezes em minhas resenhas que a popularização dos streamings/redes sociais ajudou a dar voz para artistas que normalmente não encontrariam o mesmo alcança sem essas plataformas. E é por isso que presenciar a ascensão da islandesa Laufey é algo apenas possível pela descoberta do público dessa maneira “viral”. Isso é ainda mais louvável ao ter a consciência do talento da cantora como mostra o ótimo álbum Bewitched.
Após chamar a atenção ao postar suas canções/covers no TikTok, a cantora começou a ganhar atenção de artistas (Willow Smith e Billie Eilish) e de uma parte de um público relativamente pequeno, mas bastante consistente e barulhento. E em uma primeira analisada fica meio complicado explicar o motivo especifico para o sucesso da cantora, mas olhando um pouco abaixo da superfície é fácil notar. A sonoridade da cantora consegue fazer algo complicadíssimo ao ser nostálgica e uma verdadeira lufada de ar fresco. Resumidamente, a sonoridade de Bewitched é uma mistura tradicional de jazz/american jazz com adição de bossa nova e pop/jazz pop, sendo inspirada em nomes como Tony Bennett, Frank Sinatra, Ella Fitzgerald, entre outros. Entretanto, ao contrário que contemporâneos da cantora que decidem basicamente regravarem clássicos desse cancioneiro, Laufey decidi seguir um caminho mais singer-songwriter ao escrever novas canções para o álbum, tirando apenas um cover. Essa decisão é importante para dar para a artista essa personalidade traz um passado lembrado e admirado por muitos, mas soar como uma novidade única e excitante. E, dessa maneira, o resultado de Bewitched é exatamente isso: não é nenhuma revolução e se baseia totalmente no que já foi feito, mas ainda assim existe um brilhantismo novo e convidativo para um público em modo nostálgico. É como a gente querer comer um belo prato de arroz e feijão feito por outra pessoa: o mesmo prato, mas com um gostinho de novidade.
Tudo isso poderia ser um verdadeiro tiro no pé se Laufey não tivesse o talento de entregar composições que pudesse fazer essa ponte de maneira direta, elegante e inteligente. E isso é algo que a cantora tem de sobra. Co-escrito ao lado do produtor Spencer Stewart e uma ou outra parceria fora, Bewitched é composto lindamente por letras maduras, esteticamente refinadas, românticas em todas suas vertentes e com um apuro lírico que as tornam atemporais. Sem grandes momentos no estilo devastadores, as composições mantem sempre um nível alto e muito bem talhado para fazer a gente se sentir sempre convidado a viajar nessa maquina do tempo feito sem sair do presente. Em um dos melhores momentos do álbum, a cantora entrega a espetacular Second Best em que é possível facilmente ouvir os versos terem sido entoado por Fitzgerald ou em uma balada da Eilish. E isso é claro no simples e devastador refrão: “Oh, you were my everything/I was your second best”. Essa qualidade é emanada para todo o resto do álbum, mas encontra o mesmo parâmetro na tocante Promise, co-escrita ao lado de Dan Wilson (autor de Someone Like You da Adele), em que encontra o seu ápice no seu direto refrão em que a cantora entoa de maneira melancólica “It hurts to be something/ It's worse to be nothing with you”. Outros momentos que merecem destaque são o delicioso abre-alas Dreamer, a delicadíssima Must Be Love, Lovesick e a sua vibe indie rock, California and Me com a presença da Filarmônica de Londres e, por fim, a intima Letter To My 13 Year Old Self. Em um mar de novidades ultrapassadas, Laufey se sobressai ao fazer tudo soar excitante e, principalmente, interessante.
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