20 de novembro de 2020

Primeira Impressão

The Rarities
Mariah Carey


Apesar de não ter exatamente o mesmo sucesso comercial dos áureos tempos de maior diva do planeta é inegável que a carreira da Mariah Carey é uma das mais importantes e grandiosas de toda a história da música. E é por isso que ao chegar ao trigésimo aniversário de carreira é mais do que merecido a cantora lançar não apenas uma autobiografia em forma de livro como também uma autobiografia em forma de música com o lançamento da compilação The Rarities.

The Rarities narra com quase perfeição toda a carreira da cantora ao ser uma verdadeira jornada por todas as suas eras. Sem precisar ser uma compilação de grandes sucessos, mas, sim, uma coletânea de canções que não foram lançadas, o álbum traz a ficha corrida sonora de Mariah desde o começo de diva pop grandiosa, passando pelo começo do flerte com R&B e a criação da persona ligada ao hip hop e chegando na sua versão mais recente. Além disso, também é possível ver a cantora que adora uma regravação de uma balada “vintage” e a sua influência do jazz/blues. Tudo isso de forma condensada, coesa e muito bem estruturada em um álbum com quase uma hora de duração. Acredito que a maneira como foram escolhidas e dispostas as faixas seja a melhor e a maior qualidade de The Rarities, pois consegue contar a história da cantora sem saltar nenhuma era, criando um fácil reconhecimento para aqueles que conhecem a sua carreira de cabo a rabo e mostrando de forma quase ditada para aqueles que não a conhecem tão bem. A parte que remete os primeiros anos da sua carreira, durante boa parte dos anos noventa, é especialmente bem escolhida já que mostra com clareza e qualidade toda a força dessa era. E é dessa primeira parte que estão as melhores canções do álbum. 

Escolhida como canção que abre o trabalho, Here We Go Around Again de 1990 remete diretamente aos primórdios dançantes da cantora em canções como Someday e Emotions ao ser uma mistura de dance-pop com R&B em que é possível ouvir a qualidade dos graves da cantora. Passando alguns anos, a cantora entra em uma fase mais dramática e pomposa com a solidificação da sua parceria com Walter Afanasieff em Do You Think of Me de 1993 que começa um leve flerte mais sério com o R&B em uma balada pop romântica. E tudo fica ainda mais nítido com Everything Fades Away: gravada também em 1993, a canção é claramente parte da era do álbum Music Box que tem Anytime You Need a Friend como principal semelhante. Ao pular dois anos, Mariah começa a sua nova era com One Night que tem a parceria na produção de Jermaine Dupri em uma deliciosa R&B/pop que se mostra ligada em Daydream. Menos ousada, mas no mesmo caminho, está Slipping Away que se estabelece perfeitamente na transição para Butterfly de 1997. Com o começo dos anos dois mil na ordem cronológica é que começa o problema de The Rarities e, também, da carreira da Mariah Carey. 

Marcado por vários altos e baixos em uma década conturbada pessoalmente e artisticamente, os anos dois mil marcam o aprofundamento da sonoridade da cantora no pop e no hip hop com resultados mais variados possíveis. Acredito que o principal momento aqui é a inclusão da versão original de Loverboy que gerou toda a rixa lendária com a Jennifer Lopez por causa do uso do sample, o colapso nervoso e o fracasso de do filme e da trilha de Glitter. Analisando quase vinte anos depois é necessário afirmar que em questão qualidade não valeu a pena já que a versão “repaginada” é muito melhor que a original. Além disso, a maioria das canções aqui soam exatamente como são de verdade: demos. Ao contrário da primeira parte que as canções que tem um corpo suficientemente fortes para se sustentarem como canções que poderiam ter sido lançadas quando foram gravadas, as canções da segunda parte têm esse verniz inacabado que impede a gente realmente ter uma conexão com a mesma. Isso também reflete na sonoridade da cantora dessa época que tem em vários momentos essa sensação de estarem incompletas, passando longe de estar no mesmo nível do talento da cantora. Felizmente, o álbum ainda guarda a surpresa Save the Day que foi lançada como single de divulgação que deixa bem claro que, apesar dos anos passados e da mudança nítida da voz, Mariah Carey ainda continua como uma das melhores divas pop de todos os tempos. E em The Rarities temos um uma prova cabal disso em um álbum autobiográfico que quase nenhum artista tem a capacidade de lançar.

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