1 de agosto de 2021

Primeira Impressão

DEACON
serpentwithfeet



Quando comecei o blog lá em 2008 nunca poderia imaginar que em 2021 ainda continuaria esse projeto e, principalmente, estaria celebrando a ascensão de toda uma geração de artistas LGBTQI+ que vem mudando todo o cenário da indústria fonográfica. Não apenas a presença cada vez maior de diversidade de indivíduos, mas, também, a diversidade de sonoridades que vai do hip hop ao pop, passando pelo country e rock e até chegar ao rap e a MPB. E o mais importante é que esses artistas estão tendo a liberdade para falarem do seu ponto de vista em relação a temas que formam a base de qualquer relação humana. Por isso, ouvir o ótimo DEACON do cantor serpentwithfeet é algo extremamente gratificante devido ao fato de ser a celebração sem medo do amor queer.

Abertamente gay, Josiah Wise, nome de batismo de serpentwithfeet, transforma DEACON em uma deliciosa, importante e romântica exaltação sobre a possibilidade de expressar o seu amor e, principalmente, a sua sexualidade. Assim como qualquer outro artista heterossexual, serpentwithfeet abre seu coração sobre amores difíceis, desejos não correspondidos, as delicias do sexo, as amarguras do fim e as esperanças sobre o amor sem ter medo de se expressar ou usar subterfúgios para esconder sobre quem se refere. Apesar de não ser o primeiro a ter essa atitude, o cantor parece elevar um nível acima o que já tem sido feito ao em nenhum momento precisar tocar em assuntos como preconceito ou/e medo sobre assumir quem é. Pode parecer estranho apontar isso como uma qualidade tão importante, mas acredito que a verdadeira igualdade entre as pessoas é necessário essa sensação de normalidade entre assuntos que, no frigir dos ovos, surgem para naturalmente para qualquer pessoa. Em Same Size Shoe, serpentwithfeet narra sobre as pequenas e corriqueiras semelhanças que ajudam unir dois pessoas que se amam. Detalhes tão pequenos de duas pessoas, mas que aqui ganham essa importância de mostrar que amor é amor e que não faz diferenciação entre cor, gênero, raça ou religião. Liricamente, DEACON segue essa mesma toada ao relatar coisas comuns sobre o amor com uma poesia simples, honesta, simbólica e deslocado de uma maneira confiante e inspirado. Uma pena, porém, que o álbum é um pouco rápido demais para gerar uma significação maior para quem escuta.

Com onze faixas, mas tendo uma duração um pouco menor de meia hora, DEACON soa como uma “história” rápida demais, deixando a sensação imensa de precisar expandir essas conversas com mais tempo. O álbum produz uma sensação de poder ser uma palestra longa, mas termina soando como um despretensioso bate papo em uma mesa redonda. E isso afeta a produção, pois parece que algo ficou faltando para completar a interessante mistura de R&B, neo soul, trip hop e pinceladas de gospel e art pop. Trabalhando em uma cadencia sempre contida e climática, DEACON pode pecar por duração suficiente para trabalhar as ideias, mas nunca peca por falta de inspiração. Um dos melhores momentos do álbum é a ótima Sailors' Superstition que mistura R&B com influencias dançantes de sonoridade africanas para criar uma deliciosa batida dançante e, ao mesmo tempo, sensual. Explorando as suas raízes experimentais, o cantor entrega em Heart Storm a combinação ideal de R&B e art pop que parece ter passado direto nos anos noventa em atmosfera elétrica e elegante. Logo em seguida, a produção acerta na construção áspera e densa de Wood Boy, pois, ao contrário do resto do álbum, serpentwithfeet fala abertamente sobre sexo em uma composição apimentada sem nunca soar vulgar ou desnecessária. Outros momentos que merecem serem destacados ficam por conta da simpática e fofa Malik, a delicada e cadenciada Amir e, por fim, o ótimo single Fellowship retoma as influências africanas em um desfecho perfeito para a gente ficar desejando mais. Serpentwithfeet constrói um álbum que não quer revolucionar, chocar ou mudar a cara na música, mas, sim, falar sobre os seus sentimentos livre de qualquer amarra. E isso já é motivos de exaltação e esperança no futuro.


Nenhum comentário: