18 de novembro de 2016

Primeira Impressão

Here
Alicia Keys



Quando olharmos em retrospectiva o ano de 2016 vamos perceber que, entre outras coisas, que esse período foi aquele que as maiores estrelas da música negra americana lançaram os seus manifestos de empoderamento em forma de música. É importante notar que essa característica não é simplesmente uma tendência fonográfica, mas, na verdade, uma convergência de pensamentos que envolve um movimento sócio-político que irá continuar crescendo mundialmente devido, principalmente, ao crescimento de uma contracorrente cada vez mais forte. Pensando nesse cenário, o sexto álbum da carreira da Alicia Keys se transforma em uma desses manifestos musicais e encaixa-se como uma das peças desse grande quebra-cabeça. Em relação a carreira de Alicia, Here é uma nova amostra do imenso talento da cantora vem refinando nos últimos quinze anos de carreira, apesar de não ser o seu melhor trabalho.

Longe de um trabalho que possa ser considerado conceitual de verdade, Here parte de uma sonoridade bem tradicional para, depois, refinar todas as influências de R&B, neo soul e hip hop que a cantora já apresentou em todos os seus trabalhos. O novo trabalho, porém, apresenta um clima de uma força emocional que vem do mesmo lugar das vozes daqueles que protestam contra a violência policial contra negros ou a eleição de Donald Trump. Um lugar aonde vive sentimentos como indignação e revolta, mas que também habita sentimentos mais positivos como esperança e tolerância. Desde o primeiro segundo de Here é possível identificar essa vontade de Alicia de fazer o mundo ouvir tudo o que pensa sobre o mundo ao seu redor. Mais que isso: a cantora quer deixar a sua marca na ideologia das pessoas ao expor toda a sua raiva no que está acontecendo e, também, a sua fé em futuro melhor. Assim como fizeram Beyoncé e Solange, a principal personagem aqui é a mulher negra, mas não nuca se limitando já que o clamor aqui tem a capacidade de ir além das barreiras étnicas, culturais e sociais ao influenciar qualquer pessoa que tenha a capacidade de abrir a sua mente e coração para as mensagens contidas em cada uma das canções. Ainda que o álbum tenha essa capacidade existe um problema exatamente no quesito que deveria estar acima de todos os outros: as suas letras.

Não há como não elogiar todo o processo criativo por trás da construção lírica de Here, pois Alicia e todos os seus parceiros/colaboradores (incluindo os nomes de Emeli Sandé e Pharrell Williams) realizam um trabalho extraordinário, expressando perfeitamente todo o sentimento criado pela atmosfera sonora do álbum. É fácil identificar em cada verso a mesma área que veio toda a sensação de urgência das batidas no álbum, mas elas não tem exatamente a mesma pungência desconcertante que a sonoridade em si. Provavelmente o problema é que Alicia é muito educada para realmente meter pé na porta com toda a força possível sem pedir licença, quebrando qualquer impedimento que possa existir. Claro, essa polidez é uma qualidade intrínseca da natureza artística de Alicia, porém, no seu novo momento, as coisas não batem como deveriam e parece que sobra algumas arestas para serem cuidadas. Felizmente, nada disso retira o brilho da mensagem de Here, pois em qualquer momento que falte alguma coisa na produção sempre existirá a presença magnífica de Alicia e a sua voz que dispensa apresentações. Dessa vez, porém, é necessário abrir um parêntese: Alicia apresenta performances com uma pegada mais crua e orgânica, mostrando uma aspereza de interpretação muito bem vinda e ideal para as mensagens que precisar traduzir. Assim como a sua decisão de não usar mais maquiagem, Alicia parece querer dizer "aqui estou em meu estado mais natural e bruto! E não tenho medo de ser quem eu sou ou de ser criticada". Incrivelmente bem coeso, Here é uma obra que precisa ser ouvida por inteiro, mas alguns momentos precisam ser ressaltados: a dupla que dá inicio ao álbum The Beginning (Interlude)The Gospel são faixas que impressionam pela força da interpretação de Alicia e as suas mensagens e a que finaliza o trabalho Holy War, a melhor do álbum, tem o potencial de se tornar um pequeno clássico na carreira da Alicia. E assim deve ser o histórico de Here na carreira de Alicia: não o melhor trabalho, mas aquele que irá ser um marco definitivo para a sua trajetória e, também, para aqueles que sentirem tocados por suas mensagens.

2 comentários:

G. RLS disse...

A melhor é "She Don't Really Care/ 1 Luv" .

G. RLS disse...

Alcançou um #2 nos EUA. É um bom número não? Atualmente poucos artistas fazem REALMENTE sucesso com vendas, devido aos serviços de streaming e pirataria. Grande parte das pessoas não querem pagar por música ou reduzir esse custo, por isso o sucesso do streaming.