8 de dezembro de 2024

Primeira Impressão

Patterns in Repeat
Laura Marling





Uma das coisas que considero ainda acho impressionante na música é a capacidade da gente se envolver mesmo sem necessariamente ter passado pelos mesmos caminhos que o artista em questão trilhou. Um perfeito caso disso é da britânica Laura Marling que entrega o excepcional e intimo Patterns in Repeat.

Oitavo álbum da carreira da cantora, o trabalho foi composto e gravado após o nascimento da sua primeira filha no ano passado e é uma reflexão sobre maternidade, envelhecer e a herança que a gente traz dos nossos pais. Obviamente, muitas pessoas podem se relacionar com alguns temas ou todos os temas que são falados, mas não é necessariamente o caso. As observações e reflexões que a cantora faz aqui, sendo que a maioria das faixas foram compostas apenas por ela, encontram um lugar tão pessoal e próprio da sua vivencia que na teoria ficaria difícil encontrar pessoas que tenham vivido o mesmo e/ou tirado as mesmas conclusões. Todavia, a grande e impressionante qualidade da lírica de Marling é fazer a gente não apenas compreender perfeitamente suas crônicas, mas, sim, conseguir encontrar pontos de entendimento/emparia/semelhanças até mesmo aqueles que não se veem totalmente nos temas em Patterns in Repeat. E acredito que o principal motivo para isso é a maneira como a artista escreve suas composições.

Ao escrever a resenha do seu álbum anterior, o também ótimo Song for Our Daughter, apontei que a cantora é “dona de uma lírica poética, direta e simples, (..) tendo aquela qualidade de contadora de história que está em falta atualmente”. E isso continua ainda mais forte e verdadeiro aqui, pois o resultado final do atual álbum é mais poderoso e refinado que o anterior ao fazer a gente ficar impactado desde o primeiro momento na graciosa e humana Child of Mine sobre o sentimento de uma mãe/pai de ter “criado” uma vida. Mesmo quem não passa/passou por essa experiencia consegue se emocionar com a delicadeza sincera das palavras de Laura ao relatar a sua experiencia e para aqueles que tem essa vivencia se sentiram vistos e entendidos. E um desses momentos é quando a cantora fala sobre a sensação da passagem rápida do tempo quando vê o crescimento da sua filha e o desejo não perder nada desse processo:

Long nights, fast years so they say
Time won't ever feel the same
And I don't want to miss it
No, I don't want to miss it
And I'm not gonna miss it, child of mine

É lindo e tocante, pois é possível estabelecer outras significações sobre a passagem do tempo como, por exemplo, o filho vendo seus pais envelhecerem. Na outra ponta de relacionamento, a cantora entrega uma cândida e melancólica crônica que aparentemente é sobre a sua relação com a sua mãe na tocante The Shadows. E completando essa trindade está a devastadora Looking Back que foi coescrita pelo pai da cantora e conta com a visão de uma pessoa mais velha olhando para o passado e refletindo sobre escolhas. Mesmo sendo simples, a letra na canção é de um sentimento devastador de sinceridade, encontrando plena tradução na doce, melódica e graciosa voz de Laura que parece ao mesmo tempo flutuar despretensiosamente e entoar com emoção pura cada verso. Sonoramente, Patterns in Repeat não mostra nada de novo na sonoridade da cantora ao ser um mistura elegante e maturada de indie folk, indie pop e singer-songwriter, mas que é construído e conduzido como um barco deslizando suavemente em uma mar sereno do começo ao fim que deixa ainda mais reforçado a importância da qualidade das composições. As canções citadas até agora são as melhores do álbum, mas preciso apontar outros destaques como Patterns sobre o ciclo da vida, Your Girl que remete ao seu relacionamento com o seu pai, a relação intima de uma mãe com sua cria é retratado na quase canção de ninar No One's Gonna Love You Like I Can e, por fim, Caroline sobre se reconectar com alguém do passado. Patterns in Repeat é um trabalho tão intimo que parece que estamos quase invadindo a vida da Laura Marling, mas a cantora nos faz sentir em casa em um dos trabalhos mais tocantes dos últimos tempos.


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