8 de julho de 2018

Antes Tarde do Que Nunca - Grandes Álbuns (Edição Vencedores do Grammy de Álbum do Ano)

The Miseducation Of Lauryn Hill
Lauryn Hill


O que você estava/está/estará fazendo aos vinte e três anos? Provavelmente, as respostas serão diversas, mas tenho certeza que nenhuma, inclusive a minha, chegará perto do que a Lauryn Hill poderia dizer: aos vinte e três anos de idade foi a época que, quase completamente sozinha, compôs e produzir um dos maiores álbuns de todos os tempos. Completando vinte anos de lançamento em Agosto próximo, The Miseducation Of Lauryn Hill continua sendo um dos melhores momentos do hip hop ao ser uma experiência quase transcendental sobre amor, lições de vida e espiritualidade.

Quando começou a trabalhar em The Miseducation Of Lauryn Hill, Lauryn já tinha na bagagem a sua gloriosa participação no trio The Fugees, alcançando sucesso com o público e aclamação da critica em dois álbuns (Blunted On Reality de 1994 e o genial The Score em 1996). Durante a turnê do trio, a cantora começou um relacionamento com Rohan Marley (filho de Bob Marley) e, pouco tempo depois, engravidou do seu primeiro filho. Apesar de ter sido muito criticada por engravidar tão cedo, o que poderia "atrapalhar" a sua carreira segundo alguns, a maternidade e outros acontecimentos na vida de Lauryn foram uma verdadeira benção, pois ajudou a curar o seu bloqueio criativo e resultou na criação do seu primeiro álbum solo.

The Miseducation Of Lauryn Hill é, sem dúvidas, um dos trabalhos musicais que mais se aproximam da literatura, pois reúne uma coleção impressionante e genial de crônicas sobre a vida e o que nos rodeia como ser humanos. Livre do bloqueio criativo, Lauryn Hill foi capaz de escrever letras tão profundas como o mais profundo mar. Verdadeiras como o sermão de um religioso honesto. Belas como o amanhecer visto sob o alto de uma montanha. Honestas como o último pedido de um condenado a morte. Contemporâneas como o livro mais atemporal de todos os tempos. O que a artista fez aqui é algo que deveria ser ensinado para qualquer pessoa que pensa em ser um músico ou/e ensinado nas faculdades em aulas sobre poesia moderna. Refletindo fortemente sobre amor, espiritualidade, sociedade e sobre a sua visão sobre a vida, Lauryn Hill mostra que para ser empoderada não é necessário se intitular assim, pois naquela época ainda estava em voga o termo. Inspirada e inspiradora, The Miseducation Of Lauryn Hill é um desfile impressionante de lições e reflexões que podem não encontrar lugar em todas as pessoas, mas sempre deixa um gosto na boca e que faz a pessoa ao menos pensar sobre o assunto. O maior sucesso do álbum e um verdadeiro clássico moderno é um excepcional exemplo disso: Doo Wop (That Thing) é uma pontual e sensacional clamor pela igualdade entre os gêneros ao narrar as dificuldades de um relacionamento. Se nesse quesito já é impressionante, The Miseducation Of Lauryn Hill ainda tem muito para se "explorado".

Com já dito anteriormente, Lauryn Hill produziu praticamente sozinha todo o álbum, sendo que apenas duas faixas tiverem co-produção de outras pessoas. Esse feito por si só já seria algo impressionante, mas o resultado final de The Miseducation Of Lauryn Hill coloca a artista no mesmo nível que os grandes produtores/cantores da história ao lado, por exemplo, de Kate Bush com Hounds Of Love. Com uma atmosfera grandiosa com seus mais de uma hora de duração e nenhuma faixa com menos de quatro minutos, o álbum não sofre milagrosamente de exageros desnecessários que poderia arruinar a concepção por trás. A estrutura do álbum foi desenvolvida para ser uma sala de aula com vozes diversas conversando sobre o temas do álbum, sendo seguido por Lauryn dando lições sobre a vida de acordo com tema na faixa. Lindamente instrumentalizado e cheios de texturas e nuances que mostram a complexidade sonora, The Miseducation Of Lauryn Hill foi um dos marcos para o hip hop.

Lançado no começo do movimento neo soul, The Miseducation Of Lauryn Hill bebe da fonte do novo gênero, tanto que até tem a participação do D'Angelo no faixa Nothing Even Matters. Entretanto, o álbum não se restringe, ampliando o escopo da base de hip hop ao adicionar elementos de R&B, rap, reggae, dancehall, soul e gospel. Essa decisão de Hill cria um dos mais ricos, intricados, geniais e poderosos álbuns em que cada música é uma jornada musical impressionante. Para conseguir captar a grandiosidade da sonoridade foi necessário que a cantora entregasse uma das performances mais impressionantes de todos os tempos. Aproveitando da sua doce e melódica voz para entoar belas batidas românticas como a linda When It Hurts So Bad, Hill elevou a outros parâmetros ao mostrar ser uma extraordinária e genial rapper cheia de cadencia, força e dona de um flow perfeito que é responsável por momentos deslumbrantes como em Lost Ones ou a belíssima regravação de Can't Take My Eyes Off Of You. E olha que nem estou falando dos melhores momentos do álbum que ficam por conta da doce e melancólica Ex-Factor, a lição sobre hip hop e vida em Superstar e a homenagem ao Stevie Wonder usando a melodia de Living For The City em Every Ghetto, Every City. Dona de uma personalidade complicada e fascinante ao mesmo tempo, Lauryn Hill até o momento não lançou o sucessor de The Miseducation Of Lauryn Hill, apesar de continuar a se apresentar em shows e fazendo alguns projetos menores aqui e ali. Sempre há esperanças que ainda ouviremos o segundo álbum da cantora, mas sem esse não vier, Lauryn Hill já cravou o seu nome no Olimpo da música com apenas um álbum.


Um comentário:

NO DIA EM QUE EU SAI DE CASA............... disse...

Álbum histórico e parabéns pela resenha! Para quais álbuns da história você daria a nota 100?