29 de dezembro de 2020

Primeira Impressão

Women in Music Pt. III
HAIM



Ao longo dos anos que estou fazendo resenhas de álbuns aprendi que, apesar de não ser possível totalmente separar o fã de música que vive em mim com o lado crítico, é necessário sempre ter um visão neutra quando estou analisando um trabalho, especialmente de artistas que não tenho muita simpatia ou/e aqueles que não conheço muito bem. Nessa segunda opção está o caso da banda de irmãs HAIM já nunca tinha ouvido nada da banda até esse ano com o lançamento do terceiro álbum intitulado Women in Music Pt. III. E, possivelmente, devido a essa característica que o resultado final na minha visão é um raro acontecimento já que ambas as minhas personas tem algo diferente para dizer: o fã não parece ter muita afinidade com a sonoridade da banda, mas o crítico acredita que o álbum seja um trabalho interessante e com ótimas surpresas ao longo do caminho.

Women in Music Pt. III é uma mistura curiosa, inteligente e, várias vezes, ousada de indie rock com indie pop e soft rock, mas que demora para realmente empolgar ao causar um ruído durante a sua primeira parte. Produzido quase inteiramente por Danielle Haim (integrante da banda), Rostam Batmanglij e Ariel Rechtshaid, o álbum faz uma viagem despretensiosa e cheia de personalidade em uma sonoridade que parece ter saído diretamente dos anos noventa com nomes como Sheryl Crow e a banda Hole como faróis guias. A imagem mais forte que veio a minha mente foi como ouvir uma trilha sonora de um série adolescente dos anos noventa. Apesar de ter essa atmosfera que emala um carisma iluminado de nostalgia bem vinda, o álbum dá uma travada na sua primeira parte no momento em que pende mais para um lado de indie rock com toques de experimental, criando um obstáculo um pouco difícil de superar. Ouvir essa parte é como estar diante de um prato de alta gastronomia que a gente sabe que é algo genial, mas, infelizmente, o nosso estômago parece não estar muito disposto a se entregar nessa viagem. Isso está longe de dizer que as canções aqui são ruins ou algo parecido, mas, sim, que o gosto que se sente poderia ser diferente. Por isso, melhor pensar que a primeira parte seria as entradas de um jantar que deve ser mostrar um ótimo banquete. Entre os sabores aqui estão o toque jazz/blues e tempero de doo-wop da fofa Los Angeles, o pop rock estilo Sheryl Crow em The Steps e Gasoline parece adicionar uma camada deliciosa de rock soul na mistura. E assim como esse jantar é quando o prato principal chega que as coisas realmente melhoram, pois existe uma mudança significativa ao ir da alta gastronomia para a culinária popular. 

Logo nos primeiros segundos de 3 AM já é possível perceber a mudança de direção de Women in Music Pt. III. A canção dá uma guinada de 180° ao introduzir uma ousada e deliciosa camada R&B/soul em uma canção que poderia facilmente ter sido feita nos áureos tempos do TLC. E é a partir desse momento que o álbum vai realmente melhorando aos poucos na minha visão, deixando de lado o verniz do rock para adotar algo mais pop. É necessário dizer que não tenho nada contra o rock e as suas vertentes de forma geral. Na verdade, eu adoro rock em todas as suas formas, mas o que acontece em Women in Music Pt. III é que o HAIM consegue funcionar bem melhor quando o pop é a camada final na construção da sua sonoridade. Isso é tanto um fato que logo em seguida de 3 AM surge o melhor momento de todo o álbum: Don't Wanna é uma carismática, fofa e romântica pop rock que faz a gente bater o pé ao ritmo da ótima batida. Uma fato interessante é que as outras três melhores faixas do trabalho e que seguem essa mesma característica foram colocadas como bônus track: o single Now I'm in It que defini como sendo “estranha, nada comercial e com uma produção que vai adicionando nuances que não funcionariam em outra, sendo o tipo de canção pop para aqueles que estão cansados do atual pop”, a emocionante balada indie pop/folk Hallelujah sobre a união das três irmãs e, por fim, a cool e despretensiosa Summer Girl. E apesar dessa considerável melhora, o álbum ainda tem uma pedra grande no caminho: a não conexão das composições com o público. 

É melhor reformular essa última frase dizendo que o álbum ainda tem uma pedra grande no caminho: a não conexão das composições comigo. Obviamente, outras pessoas devem sentir as letras do HAIM de forma honesta, sincera e verdadeira, mas não foi exatamente assim com a minha pessoa. Devo admitir que tecnicamente, as composições são ótimas e esbanjam criatividade, maturidade e uma clara vontade de criar uma jornada emocional sem precisar de recorrer a clichês fáceis. E, apesar da ótima qualidade, parece existir uma atmosfera levemente de “garotas nerds e seus dramas sentimentais” que não oferecem a possibilidade de um público mais abrangente se sentir representado pelas crônicas da banda. Isso também não quer dizer que não existam outros momentos de qualidade em Women in Music Pt. III: Another Try com a batida indie pop com toques folk, a indie pop/folk Leaning on You e sua batida levemente country, a irônica Man from the Magazine sobre masculinidade tóxica, a batida sensual de All That Ever Mattered e, por fim, a indie rock com uma guitarra inspirada no Prince FUBT. Cheio de personalidade do começo ao fim, Women in Music Pt. III não é exatamente um trabalho que irei retornar com facilidade. Todavia, o meu lado critico acredita que o trabalho é um projeto interessante e inteligente que deve encontrar o seu público até mais fácil que imagino.

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