19 de dezembro de 2021

Primeira Impressão

Purakê
Gaby Amarantos






Apesar de ter uma carreira que está se aproximando de vinte anos de estrada, a Gaby Amarantos chega apenas agora ao segundo álbum da sua carreira. Depois de quase dez anos do seu debut Treme que teve o imenso sucesso de Ex-Mai Love, a cantora lança Purakê em seu melhor momento como artista, pois o resultado mostra o amadurecimento de uma cantora que tem plena consciência de quem é e de onde veio.

Purakê é uma celebração festiva, carinhosa e radiante de vários gêneros e ritmos brasileiros que durante muito tempo foram considerados apenas como brega. Não é apenas uma celebração, mas, também, um olhar ao futuro dos sons saídos da Amazônia e adjacentes, transformando o álbum em um encontro do tradicional com o novo de maneira fluida, generosa e encorpada. A principal qualidade do álbum é a ótima produção do também cantor Jaloo. Criando uma coleção de canções que soam completamente finalizadas e com um cuidado extremamente especial, o álbum foge de qualquer possibilidade de terminar como um trabalho com apenas ótimas intenções e ideias válidas para ser um projeto com corpo, alma e, principalmente, coração. A principal prova disso está na sensacional Vênus Em Escorpião: “uma surpreendente mistura de tecnobrega, tecnomelody, electropop e dance pop que na teoria não deveria funcionar. Na prática, porém, o resultado é uma excitante, classuda e ousada canção que consegue conquistar aqueles que podem ter algum tipo de problema com estilos nacionais, não apenas pela inclusão de gêneros gringos, mas, principalmente, devido a inteligência na produção em valorizar a sua brasilidade”. A canção tem a sua força aumentada devido as participações do lendário Ney Matogrosso e da cantora Urias. E isso é outro ponto alto de Purakê.

Ao contrário de outros artistas que enchem álbuns de participações que não fazem peso e apenas servem para encher linguiça, Gaby valoriza cada convidado de maneira exemplar. E o principal momento disso é na faixa abre alas de PurakêÚltima Lágrima. A faixa tem as presenças ilustríssimas de três lendas do cancioneiro brasileiro: a voz de Dona Onete declamando alguns versos em off, a gigantesca Elza Soares e a titã do samba Alcione. Devo admitir que a canção fica até pequena demais para tanto talento, mas não ofende o talento de ninguém ao dar espaço suficiente para todas colocarem as suas marcas. Outro momento impressionante de dueto é na baladona Amor Para Recordar com a presença da sempre sensacional Liniker. Apesar desses destaques de convidados, a estrela de Purakê é a Gaby que faz a gente perceber o quanto boa cantora a paraense é na verdade.

Dona de uma voz forte e com uma áurea que mistura os seus regionalismos com um toque das grandes cantoras da era do rádio, Gaby consegue segurar as canções mais densas com as extrovertidas com a mesma facilidade. Em Arreda, Gaby se joga com força no tecnobrega usando o grave da sua voz sem medo juntando forças com a Leona Vingativa e Viviane Batidão. Já em Rio, a cantora mostra um lado extremamente emocional em uma performance tocante. O problema de Purakê é o que chamo de falta de letra. Apesar de não apresentar nenhum momento que seja abaixo da média, várias composições do álbum apresentam a mesma estrutura de verso/refrão/repete o primeiro verso/refrão até o final. Falta mais um trabalho de quebrar esse ciclo para dar ainda mais profundidade para as canções. Felizmente, Gaby supera esse problema com ótimas canções como, por exemplo, Opará com a presença de Luedji Luna, a empoderada Selfie sobre amor próprio, Sangrando em parceria com Potyguara Bardo e, por fim, o produtor Jaloo dá as caras em Tchau “uma deliciosa e carismática mistura de brega, techo brega, arrocha e toques bem vindos de pop em uma canção que não tem medo de exalar a sua brasilidade”. Ouvir Purakê ajuda a mostrar o quanto parte do Brasil ainda está desconectado da verdadeira sonoridade nacional, mas fico feliz por artistas como a Gaby Amarantos por mostrar esse Brasil. Espero que não precise passar mais dez anos até o próximo álbum.


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