SPELLLING
Ao terminar a resenha de The Turning Wheel (2021), afirmei que “o trabalho magistral de Spellling mostra que sempre haverá espaço para artistas com esse senso tão específico para criar a sua arte, mesmo que estejam em extinção”. Essa afirmação pode ser perfeitamente aplicada ao impressionante Portrait of My Heart, em que a artista novamente expande seus limites artísticos em um trabalho marcante e transgressor.
Tudo começa com a mudança estilística que a cantora faz em relação ao álbum anterior, ao transitar do art pop/pop soul/progressivo para o art rock/prog rock/pop rock — o que poderia ter resultado em algo abrupto demais, causando uma quebra de expectativa desarticulada e excessivamente estranha. Felizmente, a produção, conduzida pela própria cantora, estabelece um fio de coesão sonora que passa longe desse risco. A forma como Portrait of My Heart é construído mostra que ele é, claramente, uma obra-irmã de The Turning Wheel em essência e espírito. No entanto, a coesão aqui é ainda mais refinada, o que resulta em um álbum um tantinho superior, especialmente por atenuar a sensação de conter mais fillers do que o recomendado.
Tudo começa com a espetacular faixa-título: Portrait of My Heart. A canção apresenta um “majestoso requinte sonoro” ao ser uma densa, épica e graciosa fusão de art rock, post-grunge e chamber pop, resultando em um instrumental inspiradíssimo que cresce aos poucos, em uma escalada contínua e fascinante. A condução da produção é impressionante, fazendo a faixa soar como um verdadeiro redemoinho musical que nos puxa para seu centro. Isso é acompanhado pela excepcional presença da cantora, que novamente usa sua potente e singular voz para entregar uma performance emocional, grandiosa e deslumbrante".
É da presença de Chrystia "Tia" Cabral — nome de nascimento da artista — que boa parte da força motriz do álbum provém, já que sua incrível mutação vocal serve de base para que cada canção ganhe personalidade própria. Por exemplo, outro grande momento do álbum é a nostálgica e romântica Destiny Arrives, em que a cantora incorpora a persona de uma estrela do rock dos anos 1980 com uma performance impressionante. Já em Keep It Alive, ela assume uma forma mais punk, ao entoar a canção com uma energia agressiva e vibrante — uma mistura de art rock e pop rock. Outros grandes destaques do álbum são a construção melódica e etérea de Mount Analogue, e a melancolia penetrante de Ammunition.
Portrait of My Heart é um trabalho que, muito provavelmente, não encontrará um público amplo — mas, novamente, Spellling encontra seu espaço ao expor toda a sua visão artística, majestosa e única, que definitivamente merece ser escutada.


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