Letter To You
Bruce Springsteen and the E Street BandO novo álbum do Bruce Springsteen um ano após ter lançado o incrível Western Stars coloca o roqueiro de volta a sua sonoridade tradicional em um trabalho classudo, honesto e de um vigor impressionante. Todavia, Letter To You continua a explorar um sentimento de reflexão para o passado em busca de encerrar assuntos pendentes, revisitar momentos importantes que o fez chegar até aqui e procurar algumas estradas para o futuro. E essa sensação fica ainda maior quando foram inclusas canções que o próprio escreveu bem no comecinho da carreira, fazendo um encontro imperdível para os fãs do The Boss.
No álbum anterior, Bruce voltou os olhos para uma sonoridade misturada de americana, country e folk. Ao voltar a gravar com a sua banda the E Street Band, o roqueiro retoma de cabeça a sonoridade original que o fez ser a lenda que é: um poderoso e cheio de personalidade rock com doses cavalares do chamado heartland rock. E, por isso, Letter To You não apresenta nada de novo sob o Sol, mas isso é compensado pela gigantesca qualidade técnica e artística que a produção coloca a todo segundo na construção do álbum. E boa parte disso é devido ao fato de Bruce e a sua banda gravarem todo o álbum ao vivo, juntos em um estúdio e, normalmente, tocando apenas uma vez cada canção. Devido a essa característica, o álbum se torna uma experiência rara para um trabalho gravado em estúdio, mas com uma sensação de show ao vivo pungente. Com uma instrumentalização grandiosa e pomposa, mas orgânica e fluida, Letter To You mostra a importância de prestar atenção a cada instrumento, pois existe um lugar para cada no tecido sonoro e que deve ser valorizado mesmo tudo fazendo parte de um grande quadro final. Isso fica claro na canção que dá nome ao álbum: a faixa Letter To You é uma caixa imaculada de tudo que é de bom na música de Bruce Springsteen. Entretanto, o ponto alto do álbum é o encontro desse maduro e contemplativo Bruce com aquele que ainda nem tinha tido o primeiro sucesso ainda.
Composto por doze faixas, o álbum é em parte resultado do final de um bloqueio criativo do artista, mas, também, uma passada a limpo de um passado distante. Especificamente em três faixas: Janey Needs a Shooter, If I Was the Priest e Song for Orphans foram escritas antes do lançamento do seu primeiro álbum em 1973. Apesar de terem sido gravadas por outros artistas aos longos das décadas, nenhuma delas tinha recebido o tratamento pelas mãos de Bruce. E, obviamente, existindo uma diferença sobre o que o Bruce de ontem e o Bruce de hoje encaram a construção de cada canção, os três momentos são sem nenhuma dúvida pontos altos de Letter To You, especialmente as duas últimas. Em If I Was the Priest, a produção cria uma longa, tocante e marcante viagem sonora para carregar a poderosa e significativa composição que mistura imagens católicas com a conquista do velho oeste e uma forte e inegável influência do Bob Dylan. Já na melancólica Song for Orphans, Bruce canta para aqueles que se perderam na busca pela fama, carreira e o amor pela arte de forma emocionante. Apesar de terem sido refeitas na visão do velho Bruce, as duas canções mostram uma urgência na reflexão sobre o que aquele jovem artista vivia. Dura nas construções de suas imagens e de uma pureza que apenas a juventude pode trazer, as composições criam um forte contraste com o contemplativo Bruce que dialoga com temas como envelhecer, remorso e a morte. Começando o álbum, One Minute You're Here fala sobre a incerteza do futuro que nunca podemos saber até quando estaremos aqui. E fechando o trabalho surge a continuação dessa reflexão em I'll See You in My Dreams em que Bruce, carregado com todas as memórias e as lições, esperando encontrar no final da estrada aqueles que lhe foram queridos ao longo da vida. E enquanto faz profundas meditações sobre a vida, Bruce ainda tem tempo de falar sobre politica na pungente Rainmaker que claramente se direciona ao um certo ex-presidente dos Estados Unidos que ainda não aceitou a derrota. E mesmo que Letter To You não seja direcionado para um público mais amplo é preciso ressaltar que Bruce Springsteen ainda continua a fazer música inspirada para todos aqueles que consegue tocar de verdade.
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