15 de janeiro de 2021

Primeira Impressão

Such Pretty Forks in the Road
Alanis Morissette




Alanis Morissette já tem o seu nome cravado no panteão de maiores nomes da indústria fonográfica devido a construção de uma carreira frutífera desde a sua ascensão ao estrelato lá nos meados dos anos noventa. Entretanto, a canadense vem sofrendo de uma baixa na qualidade de seus lançamentos nos últimos dois álbuns que deixou a artista em uma perigosa situação de ficar presa pelas amarras da sua própria persona artística. Eis que surge 2020 e a cantora lança o seu nono álbum Such Pretty Forks in the Road para provar que ainda tem muita palha para queimar sem precisar de renovar o seu combustível, mas sabendo como colocar novos elementos muito bem vindos.

Quando lançou o seu definitivo álbum Jagged Little Pill em 1995, Alanis se tornou a voz de uma geração reverberando sonhos, aflições, iras, medos e desejos de um público em busca de um caminho. Mais de vinte anos depois, a cantora perdeu toda a urgência, pois, assim como o seu público, os anos passaram, a maturidade chegou e os problemas mudaram para dilemas contemplativos em que a cantora se coloca em uma posição de reflexão e, não, de ataque quando atingiu o seu ápice na carreira. E isso não é nenhum problema, pois Such Pretty Forks in the Road, além de manter várias qualidades da artista, é o perfeito veículo para narrar os sonhos, aflições, iras, medos e desejos de uma geração que chegou à meia idade com filhos, casamentos e hipotecas para pagar. E é nessa configuração que entra Alanis que aos seus quarenta e seis anos é mãe, esposa e, provavelmente, deve ter algumas dividas para pagar. Por isso, o nono álbum da cantora é experiência de uma artista madura que sabe dialogar com seu público como se fosse uma conversa entre amigos de longa data. Tudo começa com uma canção que parece fazer a ponte perfeita entre o passado e o presente: Smiling, canção inspirada no álbum de 1995 e feita para o musical baseado no mesmo, é uma poderosa, atemporal e pomposa indie rock que captura a sensação de continuidade de uma pessoa durante a vida em que, apesar de todos os erros, precisa continuar a sua caminhada por mais duro que pareça. Mesmo sendo o melhor momento do álbum logo no começo, Such Pretty Forks in the Road ainda guarda gratas surpresas. 

Produzido inteiramente por duas produtoras (Alex Hope e Catherine Marks), o álbum acerta no tom em saber dosar características tradicionais de Alanis com um verniz moderno sem soar pretencioso. Também não espere grandes mudanças na base sonora de Alanis, pois, Such Pretty Forks in the Road é um sólido, redondo e requintado trabalho de indie rock/indie pop que remete aos melhores momentos da sua carreira. Melhor álbum de Alanis desde Under Rug Swept de 2002, o trabalho é aquele tipo que quem gosta da artista irá continuar a gostar sem nenhum problema, mas quem não gosta vai continuar com a mesma opinião. E se a canção que abre o álbum já não deixa claro isso, Ablaze mostra que a cantora não perdeu a sua personalidade em uma indie rock/pop rock animadinha que faz a gente querer bater os pés no chão e cantar o refrão. Verborrágica e dona de uma lírica na linha exata que separa o pretencioso, o orgânico e o intelectual, a cantora entrega uma crônica sobre as diferenças entre mulheres e homens e como é para uma mãe cria-los em um mundo que ainda tão injusto. Obviamente, a mudança temática é devido aos anos passados que fazem peso nas costas de Alanis, mas, felizmente, ainda existe uma chama ardente na maneira que Alanis escreve as suas composições. 

Misturando acidez, humor, sinceridade desconcertante e uma emoção genuína com uma enxurrada de construções sintáticas e metáforas elaboradas para descrever emoções que poderiam ser expressadas de forma clichê nas mãos de uma compositora menos talentosa como em Reasons I Drink que “cansada e sem saco, Alanis discorre um pouco dos seus maus hábitos que ajudam a compensar os problemas da sua vida sem se lamentar ou fazer julgamentos. E aí que encontramos a antiga Alanis ao ter medo de expor sentimentos profundos sem ter medo do julgamento das outras pessoas, ajudando a identificação de quem está passando por isso”. Outro ponto importante da evolução de Alanis é ouvir que a cantora aprendeu a ser genuína feliz, apesar de todos os problemas. Sandbox Love é a visão sobre como encontrar de forma saudável a sua sexualidade depois lidar com os traumas de ter sido vítima de violência sexual. O tema é forte e espinhoso, mas com Alanis tudo se torna esperançosa e até mesmo romântica. Isso não seria possível, porém, se a cantora ainda não mantivesse outra das suas qualidades em alta: a potencial vocal. Com arestas aparadas, amadurecida e mais “amaciada” devido a experiência, Alanis consegue imprimir a sua personalidade única sem cometer exageros e, principalmente, entregar a força emocional que as suas canções precisão. Her é entoada de forma delicada e contida para reforçar a exaltação da jornada pelo eu da cantora através do amor próprio e do empoderamento. Ao narrar as dificuldades e as glórias de poder encontrar o equilíbrio em um relacionamento, Alanis busca um tom reflexivo para emoldurar a história de duas pessoas que se encontraram o ponto ideal no meio do cominho. A força bruta e crescente que a cantora vai colocando na grandiosa Nemesis combina com o turbilhão de sentimentos que a gente passa ao se ver obrigado a mudar a nossa vida como aconteceu nesses messes de pandemia. Finalizando Such Pretty Forks in the Road surge Pedestal em que a Alanis faz uma crônica forte sobre nunca colocar ninguém em uma avalição intocável, pois tudo não pode parecer de apenas ilusão. Com essa pílula de sabedoria de uma artista que encontrou o seu lugar no mundo que o álbum termina, mostrando que talento é como vinho: melhora com tempo, mas precisar ser bem cuidado para não expirar antes do tempo. E tempo é algo que só fez bem para a Alanis Morissette.

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