Mariah Carey
Ao chegar ao décimo sexto álbum da carreira, Mariah Carey continua a demonstrar que, mesmo não estando em seu auge, ainda tem força para entregar um trabalho sólido e, em alguns momentos, inspirado. O problema, porém, é a oportunidade perdida ao não explorar de forma mais ampla a química criativa da artista com o cantor e produtor Anderson .Paak.
Das onze faixas, as duas melhores — disparadamente — são justamente aquelas que contam com a presença dele, possivelmente mais conhecido como a outra metade do Silk Sonic ao lado de Bruno Mars. Play This Song — que tem a participação direta e a coautoria de Paak — e I Won’t Allow It — que leva sua coprodução — oferecem a Mariah uma faceta mais soul, inspirada no lado mais tradicional do gênero. Esse direcionamento é realmente inspirado, pois dá à cantora um material maduro, classudo e substancial, que combina perfeitamente com sua personalidade e ainda dialoga com sua discografia mais recente. O mais interessante é que ambas as faixas são esteticamente distintas, o que reforça ainda mais suas qualidades.
Play This Song é uma balada romântica com andamento cadenciado, emoldurada no estilo dos grandes duetos do soul, com uma divisão de vocais muito bem estabelecida entre os dois artistas. A química entre Mariah e Paak confere suculência à faixa e a impressão de se tratar de um trabalho de pedigree. Já em I Won’t Allow It, a produção é adornada com refinada e convidativa mistura de disco, dance e funk, resultando em uma batida dançante e requintada que poderia ser mais explosiva, mas consegue manter a empolgação do início ao fim. Se o restante do álbum tivesse mais da mão de Anderson .Paak, certamente o resultado seria ainda mais forte.
Here For It All está longe de ser um álbum ruim — sendo, na minha opinião, superior a Caution. Faltou, contudo, maior coesão sonora para aparar arestas e uma força criativa que impulsionasse essa sólida coleção de canções entre o R&B, soul, gospel e pop. É como se a produção, liderada pela própria Mariah, tivesse pisado no freio para andar bem abaixo da velocidade permitida, apenas para apreciar a paisagem, desperdiçando parte do potencial do veículo. O destino é alcançado, mas a viagem soa reta e segura demais.
Um exemplo disso é Nothing Is Impossible. O que deveria ser a grande balada do álbum acaba se revelando um momento contido demais para o que a melodia inicial promete e para o que a letra busca transmitir. Ainda assim, o resultado é digno de elogios pela produção elegante e pela performance emocional da cantora.
Outro ponto importante de Here For It All é a voz de Mariah. É mais do que óbvio que ela já não possui o mesmo alcance do auge, mas, felizmente, sua voz ainda guarda vigor quando necessário. Mais do que isso: a artista encontrou formas de explorar novas facetas vocais, especialmente em registros mais graves. Nem sempre funciona, mas quando dá certo, fica claro o domínio que ela tem sobre seu instrumento. Em Type Dangerous, por exemplo, "a produção vocal é ideal para o momento atual de sua voz, sem enterrá-la em efeitos pesados que poderiam fazê-la perder personalidade".
O álbum se encerra com a faixa-título, Here For It All, que oferece um vislumbre daquela Mariah grandiosa de outrora, numa canção gospel/R&B que cresce aos poucos até um final apoteótico. Talvez o ponto mais frágil do disco esteja em suas composições, que, embora nunca atrapalhem, carecem do brilho característico das letras de Mariah. Ainda assim, há outros destaques além das faixas com Paak: a melódica baladinha In Your Feelings e a poderosa faixa de abertura, Mi.
Here For It All não chega perto do que Mariah poderia entregar em sua plenitude, mas ainda reafirma seu talento atemporal e sua relevância no cenário atual.


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