30 de junho de 2020

Uma Mistureba Pop

Love Not Loving You
Foxes

Durante um bom tempo durante a metade da década passada, a britânica Foxes parecia ser o próximo grande nomes do pop na terra da rainha. E, provavelmente, a próxima grande diva pop mundial. Depois da sua participação na vencedora do Grammy Clarity do DJ Zedd, a cantora lançou dois álbuns que, apesar de algumas boas músicas, nunca tiveram o impacto que a mesma prometia. Após um hiato de quatro anos e uma Dua Lipa no meio, Foxes está de volta com mais outro trabalho promissor: Love Not Loving You.

Love Not Loving You é uma canção estranha e isso não é nada ruim. O grande mote do single é ser uma mistureba de referências pop em apenas uma canção ao juntar em um caldeirão o dance-pop com new wave que encontra a sonoridade da Kylie Minogue com a da Carly Rae Jepsen e uns toques da Cyndi Lauper e uma pitada da Taylor Swift. Mesmo que falte um pouco de personalidade própria no meio, o resultado de Love Not Loving You é bem melhor que o esperado em uma canção efervescente, instigante e que vai crescendo aos poucos na nossa cabeça. A sua melhor qualidade é a esperta e interessante composição sobre a felicidade encontrada após se livrar de um relacionamento tóxico. Espero que a canção possar marcar uma volta de uma artista que esteve várias vezes a beira do estrelato.
nota: 7,5

Faltou Tempo

TKN
ROSALÍA & Travis Scott

A parceria da espanhola Rosalía com o rapper americano Travis Scott em TKN tem um grande defeito: a insuportável sensação de quero mais.

Provavelmente a parceria mais inusitada dos últimos tempos, TKN é uma mistura esquisita, surpreendente e de uma pungência ímpar de latin pop, reggaenton e trap que funciona mais do que qualquer expectativa. Forte desde o primeiro momento, o single tem uma sensação de equilíbrio e reciprocidade entre os dois estilos distintos dos envolvidos que a ajuda encontrar um meio termo inspirado. O mais surpreendente é que a presença de Travis Scott é realmente boa, principalmente o seus versos em espanhol. O problema central da canção é que com apenas dois minutos e nove segundos não há tempo para que realmente consiga chegar no ápice do seu potencial. Se não fosse por isso, TKN poderia facilmente estar no topo das melhores do ano. Mesmo assim, a canção já uma música louvável.
nota: 7,5


28 de junho de 2020

Primeira Impressão

Histórias Da Minha Área
Djonga

Rewind

Primeira Impressão

Ladrão
Djonga



Existem momentos na nossa vida que parece que recebemos um tapa na cara do universo, demandando que a gente acorde. Esse tapa pode ser o momento que transborda o balde para que possamos chuta-lo em uma emprego que não está dando mais certo. Esse tapa pode ser após uma única frase desferida por quem a gente ama, fazendo a gente perceber que essa pessoa não é quem a gente deveria estar. Existem bons tapas como, por exemplo, aquele que faz a gente finalmente decidir qual a profissão seguir. Alguns tapas, porém, não obtêm uma reação da nossa parte e, sim, um despertar reflexivo em relação algum situação que a gente precisar olhar ainda mais profundamente. É nesse último caso que entre o tapa que recebi ao ouvir o álbum Ladrão, terceiro trabalho do rapper brasileiro Djonga.

Não tenho a menor dúvida que o Brasil é um país racista, pois só assim que explica a eleição do atual presidente, oitenta tiros em um carro de pai de família, o assassinato da Marielle e a vencedora de um dos principais programas do Brasil ser uma racista. Apesar de considerar a minha raça como sendo a negra, eu preciso lembrar que o tom claro da minha pele fala mais alto. Nunca passei por problemas que negros com a tonalidade escura passaram como, por exemplo, serem seguidos por seguranças em lojas ao entrar ou ser parado pela polícia simplesmente por estar andando na rua. Não passei por nada disso, mas tenho a consciência que isso é uma realidade vivida por milhares de centenas de pessoas. Essa constatação já faz parte da minha vida já tem alguns bons anos, mas, infelizmente, parece que algo foi "amaciado" em mim. Vivendo no nosso país, especialmente nos últimos anos, tenho a impressão que fui criando um escudo para receber noticias sobre os principais problemas sociais. Isso ajudou a entorpecer a dor, o horror, a raiva e indignação que deveria existir, mas que por uma questão de sobrevivência precisou ser colocado em um modo "automático". Felizmente, existe artistas como o mineiro Djonga para lembrar que precisamos acordar e olhar de verdade para o que está bem na nossa frente. 

Ouvir Ladrão é como acordar de um longo e profundo sono, mas que tivemos previas sobre a realidade dentro dos nossos sonhos. Claro, esse despertar irá surtir efeito provavelmente apenas naqueles que realmente um dia já tiveram realmente a consciência verdadeira sobre o mundo que nos cercas. Para aqueles que acreditam em racismo reverso ou que no Brasil não existe nenhum tipo de preconceito, Ladrão irá ser uma coletânea de canções mimizentas de um cara marrento, arrogante e raivoso que apenas fala despropérios. Se você pensa assim, realmente não será um álbum para vocês e, sinceramente, nem precisa ler nada que sai desse blog. Entretanto, se você realmente sabe a verdade, o álbum irá mostrar ideias que estão ligadas as suas e, ao mesmo tempo, irá expandir a mente ao mostrar o lado da moeda de quem realmente está estampado em relevo.

Nascido em Belo Horizonte, na favela do Índio, Djonga começou a trabalhar com a música aos 16 anos, sendo inspirado por Racionais MCs e pelas poesias que lia na escola. Chegando ao seu terceiro álbum, o rapper não está nada disposto a baixar a cabeça para ninguém e apresenta em Ladrão uma coragem impressionante. Como dito antes, alguns podem achar o rapper arrogante ou marrento, mas essas devem ser características encaradas como sendo extremamente positivas já que são delas que a produção consegue retirar toda a sua força. Djonga não quer apenas meter o dedo na ferida e, sim, rasgar a mesma com a faca mais afiada possível. A intenção do rapper é de provocar para fazer quem ouve repensar, mesmo que seja pelo genuíno choque. Partindo de um ponto de vista que muitos vivem, mas que poucos tem a oportunidade de contarem a sua verdade, o rapper é uma verdadeira metralhadora de verdades nadas secretas, criticas mais ácidas e doloridas que suco de limão nos olhos, reflexões ásperas e uma fúria esmagadora e crônicas nuas e cruas de quem vive à margem da sociedade. Cada faixa é um retrato em alta definição sobre todo o que parte da sociedade quer esconder. Racismo, empoderamento negro, descaso do poder público, cultura afro e embranquecimento são apenas alguns assuntos que Djonga toca em Ladrão. E não apenas tocar, mas, sim, tece uma coletânea de manifestos em forma de música. 

Dono de uma lirica direta, relativamente simples, atual, limpa, sincera e de uma beleza bruta, o rapper alcançar um patamar de criação simplesmente perfeito. Logo na primeira e explosiva faixa já é possível sentir o impacto que o álbum produz no instante que Djonga declara: E parece que liberaram o preconceito/ Pelo menos antigamente esses cuzão era discreto. Hat-Trick é o portal feito de ouro maciço e incrustado de uma verdade desconcertante que dá o tom para toda a verborragia de Djonga. Logo em seguida, o rapper já tinha o chão de qualquer uma ao mandar Bené os versos: O que vale mais: Um jovem negro ou uma grama de pó?/ Por enquanto ninguém responde e morre uma pá. Logo no verso seguindo é possível ver reflexões ainda mais pontuais quando o rapper entoa que "Perplexo só fica quem crê em conto de fadas/ No país onde a facada que não aleija, elege". Ácido, irônico, pontual, atual, sincero e com uma fúria que não nem como não sentir, Djonga faz a sua mensagem ser de uma urgência sufocante. Nem sempre concordo 100% com o rapper, mas não tenho como não desviar os olhos e respeitar cada opinião, cada reflexão e cada critica que o mesmo construir. Lúcido o tempo todo, mas conseguindo sonhar/delirar quando necessário. Forte o suficiente para sustentar as suas mensagens, mas emocional quando o momento pede, principalmente quando toca em assuntos familiares. Conseguindo incorporar o rap internacional com a sua base de influências nacionais, Djonga entrega em Ladrão uma obra de uma grandiosidade que parte do público parece não está pronta para contemplar, mas o mesmo não está disposto a retroceder para agradar quem quer que seja. E olha que sonoramente, o rapper ainda teme espaço para crescer.

Ladrão é um excepcional, grandioso e poderoso álbum de rap/hip hop que consegue costurar referencias do rap nacional com toques do norte americano de forma inteligente e sem abaixa a cabeça. A produção é limpa, direta e com uma versatilidade impecável que dá para cada faixa personalidade única, criando um álbum pungente, épico e de uma força artística sem comparação. Todavia, o rapper ainda pode crescer, pois as canções poderiam serem sonoramente ainda mais arriscadas ao sair dessa altíssima zona de conforto que o mesmo alcança. Texturas, fusões como outros gêneros nacionais ou não, parcerias com artistas de fora do rap/hip hop e ainda mais nuances seriam suficiente para elevar Ladrão ainda mais. De qualquer forma, Djonga entrega uma obra espetacular do começo ao fim que, por enquanto, parece perfeita para o momento. Além dos momentos já citados, o álbum apresenta dois outros momentos geniais: a avassaladora parceria com o rapper Filipe Ret em Deus e o Diabo na Terra do Sol e a homenagem emocionante para a avó de Djonga em Bença. Outros momentos de destaque ainda ficam por conta da romântica Leal, a que dá nome ao álbum Ladrão, a intro Mlk Atrevido inspirada em um samba e a que fecha o álbum FALCÃO que termina com um surpreendente e bem vindo sample de Elis Regina cantando Romaria. Após ouvir o álbum e entender perfeitamente as palavras de Djonga acredito que tenha acordado de uma forma que espero que não vou fechar os olhos nem por um segundo por um bom tempo. E, queridos leitores, esse é uma das funções da música.

Rewind 2

As 100 Melhores Músicas Que Você Não Deve Conhecer

O especial de hoje de As 100 Melhores Músicas Que Você Não Deve Conhecer vai falar de uma canção que talvez você possa ter ouvido alguma vez, mas tenho certeza que nunca percebeu a importância da sua composição e como ela é extremamente atual, mesmo tendo sido lançada há quase quinze anos atrás. Na verdade, se essa canção tivesse seu lançamento datado de cinquenta anos atrás teria a mesma relevância como se fosse uma música de 2016. O motivo? A canção fala sobre....



99 Problems
Jay-Z


Quando lançou o seu oitavo álbum The Black Album em Novembro de 2003, Jay-Z já era considerador um dos melhores rappers do seu tempo e um dos melhores artistas daquele momento, pesando nas suas costas clássicos modernos do rap como os álbuns Reasonable Doubt (1996), Vol. 3: The Life & Times Of S. Carter (1999) e The Blueprint (2001). O novo álbum, porém, ajudou a consolidar de vez o seu nome no Olimpo da música devido a uma gama de fatores como, por exemplo, o seu anúncio de aposentadoria (obviamente não cumprida), as melhores vendagens da sua carreira e o lançamento da canção que é o melhor momento da sua trajetória. E olha que 99 Problems nem foi um sucesso comercial tão grande, mas tem uma importância social imprescindível para a cultura negra americana.

Produzido pelo lendário Rick Rubin, 99 Problems é um relato cru e conciso sobre a discriminação sofrida pelos negros nos Estados Unidos. Não apenas sobre o que tange o negro comum, mas também aqueles que, assim como Jay-Z, conseguem destaque ao ganhar muito dinheiro com o seu talento. A composição fala, primeiramente, sobre os críticos do rap que veem o gênero como um tipo menor de música, não dando o devido valor para os seus artistas, colocando a sua experiência com essas pessoas em destaque. Na parte final, Jay-Z discute sobre problemas de rivalidades entre a comunidade negra e problemas que isso causa. Todavia, o grande momento de 99 Problems é o seu segundo verso: o rapper descreve perfeitamente uma batida policial em que ocorre um abuso de autoridade por causa da cor da pele do dono do carro. A narração/descrição é tão bem construída por Jay-Z que é como se ele estivesse pitando um quadro vivo em nossas cabeças. Além da performance avassaladora do rapper, a produção de Rick cria uma batida poderosa para estar no mesmo nível da mensagem passada pela composição ao misturar rap com rock. Em um ano em que o assunto esteve mais em pauta do que nunca, 99 Problems é a canção mais relevante que poderia existir e que vocês precisam conhecer.

26 de junho de 2020

Rewind

Primeira Impressão

A Mulher do Fim do Mundo
Elza Soares



Quando alguém começa a citar quais as maiores cantoras brasileiras de todos os tempos sempre irá aparecer alguns nomes com certeza. Elis Regina, Maria Bethânia e Gal Gosta devem ser os nomes que encabeçam a lista, mas Rita Lee, Clara Nunes, Maysa, Nara Leão, Carmen Miranda (mesmo tendo nascido em Portugal) são figuras constantes nessas listas. Para os mais conhecedores e saudosistas da música nacional citam Dalva de Oliveira, Elizeth Cardoso, Emilinha Borba, Inezita Barroso e Ângela Maria. Nomes mais modernos como Marisa Monte, Ana Carolina, Adriana Calcanhotto e Ivete Sangalo podem ser citados. Claro, ainda existe uma dezena de nomes que ainda podem ser colocados nessa lista, mas existe um que pode passar despercebido, dependendo de quem idealiza a escolha. Esse nome é a da Elza Soares. E quando a cantora não é inclusa em uma dessa lista, acredite querido leitor, é um dos maiores sacrilégios que se pode fazer.

A Mulher Vinda do Planeta Fome

Dentro desses nomes citados, a cantora é a que melhor representa o povo brasileiro, mas não todo povo e, sim, uma pequena grande fração: os excluídos. Na sua trajetória de vida, Elza Conceição Soares enfrentou as maiores barreira para conseguir sobreviver, assim como milhares de pessoas a margem da sociedade. Nascida em 1937 (como aponta a maioria das fontes), Elza nasceu negra e pobre, quase uma sentença de sofrimento para o resto da vida. Aos doze anos foi obrigada a casar por seu pai. Ao quinze já tinha dois filhos. Aos vinte e um já era viúva. Ao se casar com o jogador Garricha, mas nunca teve realmente paz lutando contra o alcoolismo do marido e todas as tragédias que a abateu sobre a sua vida. No plural mesmo, pois foram várias. Não irei recapitular todas aqui, mas para se ter uma ideia Elza perdeu cinco filhos ao longo da vida. A dor de perder um para uma mãe deve ser o pior sentimento do mundo. Imagine cinco filhos.

Um dos momentos mais famosos da sua vida aconteceu aos vinte e um anos quando participou do show de calouros em uma rádio apresentado pelo Ary Barroso. Sempre sarcástico, ao ver aquela mulher mal vestida, magra e humilde o cantor/apresentador perguntou: 

-De que planeta você veio?
-Vim do mesmo planeta que o senhor. - respondeu Elza.
-E posso saber de que planeta eu sou?
-Do planeta fome.

Logo em seguida, Elza cantou e simplesmente arrasou, vencendo o concurso. O dinheiro de prêmio usou para comprar remédios para o seu filho doente. Então, começou uma carreira que já dura mais de cinquenta anos com trinta e cinco álbuns já lançados e algumas conquistas importantíssimas como, por exemplo, ter sido considerada pela BBC de Londres como uma das melhores cantoras de todos os tempos. Entretanto, Elza chega aos oitenta anos de idade no melhor momento artístico da sua carreira genial. Mesmo com a sua saúde debilitada, a cantora lançou no finalzinho do ano passado o álbum A Mulher do Fim do Mundo que já nasceu como um verdadeira marco histórico na história da música brasileira.

A Voz Daqueles Que Não Tem Voz

A importância de A Mulher do Fim do Mundo é de uma grandiosidade pouco vista no atual cenário fonográfico brasileiro por vários motivos. Primeiramente, o álbum é o primeiro na carreira de Elza que possui apenas canções inéditas, isto é, todas as onze faixas nunca tinham sido gravadas por outro artista. Financiado pela empresa Natura Musica, o álbum também marca o primeiro de estúdio da cantora desde 2003. Em segundo lugar, e o mais importante, o álbum é simplesmente a mais pura expressão da genialidade artística.

Produzido por Guilherme Kastrup, A Mulher do Fim do Mundo é uma avassaladora, acachapante, destruidora, lacradora e qualquer outro adjetivo que possa captar toda a genialidade por trás de cada elemento que faz parte do álbum e como eles se misturam para criar uma verdadeira obra de arte. Começa pelas verdadeiras poesias marginais que se passam por simples composições. Afirmando que a sua voz é para levar a luz os dramas das mulheres negras, mas, também, dos gays e das prostitutas. E é isso que podemos ouvir no álbum. Ouvir, não. Sentir cada palavra como se fosse uma pregação divina.

A Mulher do Fim do Mundo já começa de maneira arrebatadora com Coração do Mar, poema de Oswald de Andrade musicado por José Miguel Wisnik:

Coração do mar
É terra que ninguém conhece
Permanece ao largo
E contém o próprio mundo
Como hospedeiro
Tem por nome "Se eu tivesse um amor"
Tem por nome "Se eu tivesse um amor"
Tem por nome "Se eu tivesse um amor"
Tem por nome "Se eu tivesse um amor"
Tem por bandeira um pedaço de sangue
Onde flui a correnteza do canal do mangue
Tem por sentinelas equipagens, estrelas, taifeiros madrugadas e escolas de samba

É um navio humano quente, negreiro do mangue
É um navio humano quente, guerreiro do mangue

Logo em seguida aparece a faixa que dá nome ao álbum: Mulher do Fim do Mundo é sobre muitas mulheres negras que, apesar de enfrentarem todos os problemas do mundo, conseguem deixar tudo isso de lado ao se divertirem durante o carnaval. O seu único escape da vida que levam. O único momento em que podem se dar ao luxo de serem felizes.

Eu quero cantar até o fim
Me deixem cantar até o fim
Até o fim eu vou cantar
Eu vou cantar até o fim
Eu sou mulher do fim do mundo
Eu vou cantar, me deixem cantar até o fim

Ao final dessas duas músicas já estamos rendidos. O que vem em seguida é um verdadeiro prego no caixão emocional de quem escuta. Cada faixa é uma verdadeira crônica nua e crua sobre as vidas das pessoas que estão a margem da sociedade. Com nomes poucos conhecidos como compositores, mas extremamente competentes, Elza tem em mãos verdadeiras preciosidades de uma ferocidade tocante ao falar sobre violência doméstica, sexo, transexualidade e drogas. Existe uma verdadeira urgência em cada letra que, também, emanam uma sensação de contemplação que dá o tom perfeito o álbum. Moderno, ousado, angustiante, triste, necessário, grandioso, deslumbrante. Todos esses adjetivos são perfeitos para qualificar A Mulher do Fim do Mundo. Mas não para por aí.

O Som Ao Redor e A Voz Interior

A melhor descrição para o sonoridade ouvida no álbum é a que Celso Sim, um dos colaboradores no álbum, estabeleceu: punk-samba. A aspereza ouvida na inacreditável mistura de dezenas de instrumentos só pode ser classificada como punk, mas a cadencia, muitas vezes melódica e swingada, vem diretamente do melhor samba que se pode encontrar. Como uma ópera de malandro, a sonoridade no álbum tem uma dramaticidade suja que condiz perfeitamente com os assuntos levantados, sem nunca ser maior ou menor. Não é fácil ouvir o trabalho do começo ao fim. Existe uma especie de "pedra" no caminho, pois não estamos acostumados com tantos socos direto no estômago de uma vez só. Passada essa sensação, A Mulher do Fim do Mundo ainda guarda o seu melhor aspecto em plena força vital: Elza Soares.

Claro, a senhora de quase oitenta anos não possui a mesma voz que há vinte ou trinta anos atrás, porém, assim como uma verdadeira fênix, Elza se reinventa sem perder os seus grandes trunfos. Sempre visceral em todos os momentos, a cantora continua com a mesma gutural voz que é capaz de entoar notas que nenhuma outra cantora no mundo é capaz. É de Elza toda a alma e coração de A Mulher do Fim do Mundo. A sua bússola vital. A força da natureza que move os moinhos. O começo e o fim. Elza é a mulher no fim do mundo. Citar momentos de destaque no álbum é praticamente impossível, mas aconselho que prestem um pouco mais de atenção nas faixas Maria da Vila Matilde, Pra Fuder, Benedita e Firmeza para conhecerem o que é perfeição na música brasileira. Com A Mulher do Fim do Mundo, a cantora mostra definitivamente para os brasileiros o que vários "gringos" já tinham descobrido décadas atrás: Elza Soares é uma das maiores artistas de todos os tempos mundialmente.

Primeira Impressão - Outros Lançamentos

Dolores Dala Guardião do Alívio 
Rico Dalasam

Rewind 2

Freedom (feat. Kendrick Lamar)
Beyoncé


Apesar de ser a mais "tradicional" na questão de sonoridade dentro de Lemonade, Freedom tem a mensagem mais avassaladoramente direta e desconcertantemente atual, principalmente devido ao cenário de tensão racial nos Estados Unidos. A composição fala sobre se libertar das amarras que a sociedade impõe, mas principalmente aquelas amarras postas por a gente mesmo e que nos impede de gritar por nossa liberdade. Liberdade de sermos quem somos sem precisar "prestar" conta ou muito menos se adequar ao comportamento que uma parte da sociedade acha que é certo. A construção de diversas imagens acachapantes (Estou dizendo a essas lágrimas que me deixem, me deixem/ E que a última delas queime em chamas) são as responsáveis para elevar Freedom em parâmetros estratosféricos, transformando a canção em um hino de protesto moderno assim como Formation. O diferencia aqui, porém, é a presença poderosa e perturbante de Kendrick Lamar em um verso desconcertante em todos os sentidos, mas é Bey que invoca a sua cantora gospel interior para dar o tom da sua performance épica em uma batida que une perfeitamente neo soul, hip hop e, claro, gospel para criar uma sonoridade impactante e inesquecível para quem ouvir. Nenhuma das duas músicas precisam de sucesso comercial para validar a imensa qualidade quem ambas carregam. E nem a Beyoncé precisa validar mais nada na sua carreira.
nota: 10

A Força Negra

BLACK PARADE
Beyoncé

Analisando a carreira da Beyoncé com cuidado é fácil notar que quanto mais a cantora foi se transformando em um ícone contemporâneo mais a sua voz ativista foi se tornando mais forte e presente. E não é nada surpreendente o lançamento da inspiradíssima BLACK PARADE.

Obviamente, a canção é uma homenagem/exaltação da cultura negra em meio aos protestos pelas vidas negras de uma maneira excepcional ao conseguir ser atual e historicamente rica em referências. A composição é um dos trabalhos mais complexos, substâncias e poderosos da carreira da Beyoncé em que o público é realmente levado em uma parada de citações, lembranças e louvor da história e da cultura negra passada, presente e futura. BLACK PARADE reflete não apenas a indignação, mas o orgulho da comunidade negra. É revigorante poder ouvir tamanha celebração ser capaz de vir a luz do dia em uma época tão difícil como vivemos. Provavelmente por ser essa uma comemoração acima de tudo que a produção decidiu fazer da canção uma dançante hip hop/trap que remete ao uma versão cadenciada de 7/11. Com uma performance inspirada da Queen Bee, BLACK PARADE poderia ser um pouco menor e ter um começo mais dinâmico como o resto da canção, mas, apesar disso, o lançamento da canção, que terá os lucros revertidos para um fundo com destinação à negros donos de negócios, ajuda a fechar essas semanas com um pouco de luz e esperança para o futuro.
nota: 8,5

24 de junho de 2020

Antes Tarde do Que Nunca - Versão Single

Rise Up
Andra Day

Sucesso comercial não deve ser levado em conta como medidor de qualidade é uma das verdades que levo para mim já faz bastante tempo. E essa constatação fica ainda mais sólida ao relembrar a trajetória de Rise Up da Andra Day.

Lançada como segundo single do álbum debut da cantora Cheers To the FallRise Up ganhou notoriedade ao ser tornar uma frequente em competições musicais, homenagens em premiações e eventos públicos. Normalmente, canções com uma mensagem parecida com a de Rise Up poderia acabar como uma grande colcha de clichês sobre auto-ajuda, mas a canção foge de tudo ao ter uma inspiradora sobre superação com uma letra madura, refinada e de uma emoção genuína. E a principal razão da qualidade da canção é a performance genial de Andra Day que entrega uma força emocional impressionante, mas sem nenhum exagero que pudesse respingar na elegância da canção. Além disso, a qualidade técnica da cantora é impressionante, elevando a canção com dinamismo e um controle vocal quase sobre-humano. Mesmo que sonoramente Rise Up não seja mais do que uma power balada R&B com toques pop e gospel, o resultado apresenta uma atemporalidade impressionante. Sem ter alcançando bons resultados comerciais quando foi lançada em 2015, Rise Up ao poucos vai ser transformando em um memorável hino de esperança.
nota: 9

Uma Voz Necessária

Make Your Troubles Go Away
Andra Day

Apesar de ser conhecida pelo seu maior sucesso, a Andra Day é uma das artistas que deveria ter a sua voz ouvida por mais pessoas e em diversas canções. E o seu mais novo single Make Your Troubles Go Away prova essa teoria com propriedade. 

Make Your Troubles Go Away é uma bela e emocionante balada R&B/pop que tem na cristalina e poderosa de Andra a sua condutora perfeita. A performance da cantora é um trabalho de um refinamento único ao ter controle absoluto da sua voz e uma sensibilidade marcante para expressar sem exageros a dramaticidade da composição. Apesar de relativamente simples sonoramente, o single tem uma produção segura e bem construída e, principalmente, uma composição forte e tocante sobre se dedicar ao máximo para tentar "salvar" a pessoa que se ama de seus próprios demônios. Entretanto, Make Your Troubles Go Away é realmente marcante pela voz sublime de Andra Day que deveria ser ouvida aos quatro ventos.
nota: 8

21 de junho de 2020

Antes Tarde do Que Nunca - Grandes Álbuns Esquecidos

Spirit In The Dark
Aretha Franklin


Rewind 1

As 50 Maiores Cantoras de Todos os Tempos



Parte XI

2. 
Talento Precoce

Nascida Aretha Louise Franklin em 25 de março de 1942, em Memphis, Tennessee, filha de um pastor batista, o reverendo Clarence La Vaughan "CL" Frankln e uma 
uma cantora gospelBarbara Siggers Franklin. A quarta de cinco filhos, seus pais separam quando ela tinha seis anos. Quatro anos mais tarde, sua mãe morreu de um ataque cardíaco. Guiados pelas atribuições de pastor do pai, a família se mudou para Detroit, Michigan. Depois se mudaram para a Nova Igreja Batista Betel de Detroit onde o pai ganhou fama nacional.

Os dons musicais Franklin apareceram muito cedoAutodidata, ela foi considerada uma criança prodígio. Sendo uma pianista dotada de uma voz poderosa, Franklin cantava na frente da congregação de seu pai em Detroit. Com a idade de 14 anos, ela gravou algumas de suas primeiras faixas na igreja. Ela também se apresentava nas pregações do pai em outras cidades eenquanto estava em turnê, ela fez amizade com grandes nomes do gospel, como Mahalia Jackson, Sam Cooke e Ward Clara. 


Estrela do Soul

A vida na estrada expoes Franklin aos comportamentos adultos e com a idade de 15 anos, ela se tornou mãe. Seguido dois anos depois pelo seu segundo filho. Após um breve hiato, ela voltou aos palcosacompanhada de heróis como Cooke Dinah Washington em território pop e blues. Com a bênção de seu pai, Franklin viajou para Nova York em 1960. Depois de ser cortejado por várias gravadoras, incluindo Motown e RCA, Aretha assinou contrato com a Columbia Records. Ela lançou
 The Great Aretha Franklin pela gravadora no mesmo ano.

Em 1961, o single "
Rock-A-Bye Your Baby With A Dixie Melody" ficou em 37° nas paradas pop. Franklin teve algumas top 10 singles nas paradas de R & Bmas eles não conseguiram mostrar o talento evidente em sua música gospel. Ela e o novo marido/gerente Ted White decidiram que Franklin deveria-se mudar para a gravadora Atlantic em 1967.

Junto com músicos de soul, blues, rock e gospel, incluindo os guitarristas Eric Clapton e Duane AllmanAretha gravou o single "I Never Loved A Man (The Way I Love You)." Em meio a sessões de gravaçãoWhite discutiu com um membro da banda de apoio fazendo que Aretha e ele saissem da gravadora. Como o single se tornou um enorme sucesso, Franklin voltou para Nova York, e pode terminar de gravar "Do Right Woman, Do Right Man.."

Franklin consolidou seu reinado em 1967 e 1968 com uma série de singles que se tornaram clássicos. Em 1967, o álbum "I Never Loved A Man (The Way I Love You)" foi lançado. A primeira canção do álbum, "Respect", uma regravação de uma música de Otis Reddingchegou a No. 1 nas paradas pop e R&Be ganhou Aretha seus dois primeiros prêmios GrammyEla também teve hits com 
"Baby I Love You,'' "Think," "Chain of Fools,'' "I Say A Little Prayer"  "(You Make Me Feel Like) A Natural Woman."

Em 1968, Franklin foi convocada para se apresentar no funeral de Martin Luther King, JrEla prestou homenagem ao amigo de seu pai com uma interpretação sentida de "Precious Lord." Ela também cantou na Convenção de 1968 do Partido Democrata. No ano seguinte, ela e White se divorciaram. Franklin cantou novamente no funeral de 1972 de Mahalia Jackson. Estimulada pelo falecimento de Jackson e um ressurgimento subsequente da música gospel, ela lançou Amazing Grace em 1972 vendendo mais de dois milhões de unidades, se tornando o álbum gospel mais vendido na época.

Lutas Pessoal e Profissional

O sucesso continuou ao longo dos anos 70 levando para casa oito prêmios Grammy's consecutivos de 
Best R&B Female Vocal Performance, ela ganhou o título de "Rainha do Soul". Trabalhou incansavelmente e expandiu seu repertório para incluir rock e popmas em 1975 o seu som estava desaparecendo em favor da mania da discoteca. Na esteira deste novo gênero, um conjunto emergente de jovens cantores negros como Chaka Khan e Donna Summer começaram a eclipse Franklin. Ela encontrou um alivio em 1976  como o sucesso da trilha sonora do filme Sparkle, bem como um convite para atuar na posse presidencial de 1977l. Em 1978, ela casou com o ator Glynn Turman.

Uma série de farcassos acarretou o termino da relação de Franklin com a Atlantic em 1979. No mesmo ano, seu pai foi hospitalizado após uma tentativa de assalto em sua casa o deixando em coma. Como sua popularidade diminuiu e a saúde de seu pai abalada, Franklin também foi pega pelo Imposto de Renda. A participação especial no filme The Blues Brothers (1980) ajudou Franklin reviver sua carreira. Cantando "Think'' ao lado dos comediantes John Belushi e Dan Aykroyd expondo ela para uma nova geração de R & B amantes,. Logo ela assinou contrato com a Arista Records. Seu novo álbum foi lançado em 1982 
Jump To It, um álbum que fez enorme sucesso nas paradas de R & B e Franklin ganhou uma indicação ao GrammyDois anos depois, ela divorciou de Turman. No mesmo ano, seu pai faleceu.

Regresso

Em 1985, Aretha lançou outro álbum de grande sucessoO registro pop 
Who's Zoomin' Who? contou com a  canção "Freeway of Love",  uma colaboração com a popular banda de rock EurythmicsO trabalho se tornou álbum de Aretha mais vendido até hoje. Seu álbum seguinteAretha de 1986também foi sucesso, e o dueto com George Michael  "I Knew You Were Waiting (For Me)'' foi número 1 nas paradas pop. No ano seguinte, a intrudução de Franklin para o Rock and Roll Hall da Fama marcou a primeira vez que uma mulher havia sido concedido tal honra. No mesmo ano, a Universidade de Detroit creditou ela com um doutoramento honoris causaEm 1993, ela foi convidada para cantar na posse de Bill Clinton e em 1994 foi dado para ela um Grammy especial. Ao longo dos próximos anos, ela tornou-se tema de documentários e de várias homenagens.

Em 1998, Franklin reprisou seu papel anterior em Blues Brothers 2000, lançou o best-seller "Rose Is Still A Rose", e substituiu Luciano Pavarotti, que estava doente demais para aceitar o seu Lifetime Achievement Award. Sua interpretação de "Nessun Dorma" recebeu ótimas críticas.

Em 2003, Franklin lançou seu último álbum de estúdio pela Arista, So Damn HappyDois anos depois, ela recebeu a Medalha Presidencial da Liberdade e se tornou a segunda mulher de sempre a ser eleita
 para o Reino Unido Music Hall of Fame. Em 2008, ela recebeu seu 18° prêmio Grammy pela canção "Never Gonna Break My Faith"uma colaboração com Mary J. Blige e foi escolhida para cantar na inauguração do presidente Barack Obama. Mais recentemente, Franklin lançou seu primeiro álbum em seu próprio selo, A Woman Falling Out of Loveem 2011.

Para promover seu álbum, Franklin deu vários concertos, incluindo uma temporada de duas noites no famoso Radio City Music Hall, em Nova York. Ambos os fãs e críticos ficaram impressionados com suas performances em que ela mostrou que a "Rainha do Soulainda reina supremo.

Em sua vida pessoal, no entanto, Franklin parecia estar passando por momentos difíceis. Ela anunciou que ela iria se casar com seu  "amigo para sempre" William "Willie" Wilkerson em janeiro de 2012Apenas pouco tempo depois, Franklin disse à imprensa que o casamento fora cancelado. O casal tinha "decidido que estavam andando um pouco rápido demais e havia uma série de coisas que não tinha sido pensada cuidadosamente."

Mais de uma semana depois de romper seu noivado, Franklin sofreu outra grande perda pessoal. A morte de sua afilhadaWhitney Houston, em 11 de fevereiro de 2012, 
entristecido profundamente  ela. "É tão impressionante e inacreditável", Franklin escreveu em sua página do Facebook"Meu coração vai para Cissy, sua filha Bobbi Kris, sua família e Bobby".

Fonte:http://www.biography.com/people/aretha-franklin-9301157?page=1 

Rewind 2

Faixa por Faixa - Grandes Álbuns

CD: I Never Loved a Man the Way I Love You
Artista: Aretha Franklin
Gênero: Soul music: Memphis soul, Southern soul
Vendagem: Sem dados
Singles/Peak na Billboard: Respect (1°) e I Never Loved A Man (The Way I Love You) (9°).

Grammy
Vitórias 1968
Best Rhythm & Blues Recording e Best Female R&B Vocal Performance (Respect)

Ano: 1967

Aretha Franklin já tinha no currículo nove álbuns lançados entre 1956 e 1966 pela gravadora Columbia. Só quando ela assinou com Atlantic sua carreira realmente decolou a transformando na lenda que ela é hoje. O primeiro lançamento pela gravadora foi o momento definitivo não só pela carreira dela, mas também para a história da música e da sociedade americana. I Never Loved a Man the Way I Love You é considerado até hoje como um dos maiores álbuns já feitos e de uma importância social incrível.




Faixas

Lado Um

1.Respect: Muitos podem pensar apenas na qualidade musical que a canção tem é o que faz dela uma das melhores canções da história. Contudo, seu pano de fundo é tão importante. Gravada e escrita originalmente pelo cantor Otis Redding, a regravação ganhou contornos sociais quando o foco da canção mudou ao Aretha se firmar com uma mulher forte, independente e que pede respeito ao seu homem. Imagine isso nos anos sessenta cantado por uma negra! Isso é a história sendo feita através da música.
nota: 10

2.Drowning In My Own Tears: Você realmente sabe o que é cantar? Realmente sabe? Então ouça essa regravação de outra lenda Ray Charles e aprenda. Miss Aretha arranca o coração para expressar o sofrimento de se afogar nas próprias lágrimas de tanto sofrer. Se você não se arrepiar em cada segundo você deve estar morto.
nota: 10

3.I Never Loved A Man (The Way I Love You): Os acordes de guitarra que fazem a base ao lado de uma batida transcendental de bateria fazem da canção um marco no blues que influencio nomes como o Aerosmith.
nota: 10

4.Soul Serenade: Além de cantora, Aretha é genial pianista. Aqui ela tem a oportunidade de mostrar não só um desempenho fora desse mundo como cantora, mas a magia que pode criar com as mãos: poesia. Caso vocês ouvirem o começo da canção devem lembrar (acho) de um comercial de sabonete de muito tempo atrás.
nota: 10

5.Don't Let Me Lose This Dream: Aqui vemos com clareza as origens da nossa bossa nova na sonoridade cadenciada e simplista do blues. Escrita pela própria Aretha abrindo ainda mais o leque de alcance dessa lenda.
nota: 9,5

6.Baby, Baby, Baby: Novamente com letra de Aretha, a canção é uma carta de sofrimento sobre o fim de um amor. Ela sabe que errou, mas pede que ele entenda seus motivos. Aretha tira da voz uma tristeza cortante para expressar tanto sofrimento.
nota: 10


Lado Dois

1.Dr. Feelgood (Love Is A Serious Business): Ciúmes e luxúria ganhando contornos classudos no vocais em estado de graça de Aretha que mais uma vez assina a autoria desse sexy blues.
nota: 9

2.Good Times: De autoria de Sam Cooke, Aretha coloca uma pimenta no álbum com uma batida deliciosamente mais atrevida e dançante. A versatilidade para cantar sobre amor ou diversão fica registrada em uma música de apenas dois minutos.
nota: 9,5

3.Do Right Woman, Do Right Man: A história da canção já vale tudo: durante a gravação da música, Aretha e seu marido/empresário sumiram durante algumas semanas antes dela terminar de gravar sua parte. A gravação mostra Aretha com uma voz cheia de dor e com um tom grave e poderoso.
nota: 10

4.Save Me: A canção mais fraca do álbum é um tapa na cara da maioria das cantoras de hoje já que é melhor que vários álbuns. Um detalhe: a canção foi escrita por ela e por sua irmã Carolyn Franklin, além de ter o grupo The Sweet Inspirations, fundado pela Cissy Houston.
nota: 8,5

5.A Change Is Gonna Come: Nada melhor que terminar com a regravação avassaladora do clássico de Sam Cooke, o mais imponente e importante hino de protesto. E assim se faz lendas.
nota: 10

Rewind 3

Antes Tarde do Que Nunca - Grandes Obras Esquecidas

Young, Gifted and Black
Aretha Franklin


Não existe só uma pessoa que tenha um conhecimento básico sobre a história da música que não cite entre os maiores nomes de todos os tempos o de Aretha Franklin. Considerada uma das maiores cantoras, quando não a maior de todas, Aretha é uma das responsáveis por ajuda a modelar o cenário musical nos Estados Unidos, especialmente a soul music, e também em ser uma das maiores vozes do empoderamento feminino e, consequentemente, da mulher negra em uma época em que em que nem se falava do assunto.

A sua história na música é sempre dividida em três momentos: o primeiro sendo a sua ascensão durante os anos sessenta, o segundo começa na década posterior quando a cantora se aventura em uma sonoridade disco perdendo popularidade e vendas e, por fim, a terceira que começa no meio dos anos oitenta em que a cantora se reinventa e retoma o seu lugar de vez entre os principais nomes da música. Devido a essa divisão, alguns álbuns da cantora que ficam entre essas fases, mais exatamente em áreas "cinzas" da sua discografia, não recebem o devido valor como outros que se tornaram grandes sucessos de público e de critica. O melhor desses trabalhos na carreira longa de Aretha é o álbum que ajuda a qualquer pessoa a ter certeza absoluta da grandiosidade do seu talento, pois Young, Gifted and Black de 1972 que se transforma em um atestado da capacidade como vocalista, interprete e compositora. Reparem que dividi em três "categorias" as qualidades que fazem de Aretha a diva lendária que é, pois em Young, Gifted and Black podemos notar claramente essas qualidades individuais. 

Produzido por três lendas da soul music (Tom Dowd, Arif Mardin e Jerry Wexler), Young, Gifted and Black é essencialmente um excepcional trabalho de R&B/soul/gospel que, apesar da qualidade técnica perfeita com a presença de outros importantes nomes na parte da construção instrumental como as irmãs da cantora como backvocais e Donny Hathaway no piano, não seria a mesma coisa se não tivesse a presença de uma força da natureza de Aretha. Começa pelo fato que naquele momento a cantora estava literalmente no ápice da sua capacidade vocal e, queridos amigos, fica extremamente fácil entender o motivo dela ter sido várias vezes escolhida como a maior voz de todos os tempos. Completamente dona do seu instrumento e não deixando margem para julgamento sobre qualquer falha, pois Aretha é quase algo de outro mundo. Entretanto, uma ótima voz não é quase nada se a pessoa não tiver a capacidade de interpretar com a mesma força as canções. E isso é o que Aretha se torna realmente a maior de todas.

Young, Gifted and Black é composto de doze faixas, sendo que oito delas são regravações de grandes nomes da época e, consequentemente, de todos os tempos. Aretha escolhe canções de então relativamente novos nomes como Elton John, Lennon e McCartney e Nina Simone e, também, de nomes consagrados como Burt Bacharach, Hal David e Otis Redding, entre outros. Boas cantoras enfrentam o desafio de regravar canções entregando boas performances, cantoras do nível de Aretha transformam essa regravações em canções que parecem que foram escritas especialmente para ela, criando uma canção que parece que encontrou a sua única e verdadeira interprete. Esse é caso da faixa que dá nome ao álbum: Young, Gifted and Black foi escrita e gravada pela grande Nina Simone ao lado do poeta Weldon Irvine e obviamente ganhou vida eterna na voz da cantora e a sua força descomunal. Sem mudar muito da canção original, mas adicionando a sua própria força, Aretha quase cria uma nova canção, reclamando para si toda a atmosfera da canção que representa muito bem a cantora na época: jovem, "talentosa" e negra. Além disso, a faixa ainda tem uma atualidade em sua composição por ainda refletir a situação da comunidade negra. Se tudo isso já não bastasse, Aretha ainda demonstra a sua capacidade como compositora ao escrever quatro grandes momentos: Day Dreaming, Rock Steady, First Snow in Kokomo e All the King's Horses, sendo essa última provavelmente a melhor canção composta pela cantora na sua carreira. Young, Gifted and Black é uma obra que pode passar desapercebido devido a sombra de trabalhos de maior prestigio da discografia de Aretha Franklin, mas está bem longe de ser uma obra menor delas e deveria ser reconhecido como uma obra fundamental para quem realmente gosta de boa música.

Rewind 4

Antes Tarde do Que Nunca - Grandes Álbuns Debuts

Whitney Houston
Whitney Houston


Whitney Houston alcançou o status de uma das maiores artistas de todos os tempo de uma forma única e bem diferente da maioria dos nomes que que compõe essa lista ao ser, basicamente, uma interprete. Explico: enquanto nomes como Madonna, Prince, Mariah Carey e the Beatles tem creditado em seus nomes autorias e produções de canções, Whitney ficou toda a sua carreira sendo "apenas" a interprete de músicas feitas para a mesma. Na sua discografia inteira, a cantora tem apenas três canções em que a mesma tem sue nome como compositora: Like I Never Left, I Didn't Know My Own Strength e I Got You, todas do seu último álbum I Look to You. Como produtora, Whitney tem um histórico um pouco melhor com sete faixas da trilha sonora The Preacher's Wife. Entretanto, a quantidade dessas canções comparada com o imenso catálogo da cantora é quase ínfimo, principalmente em relação aos grandes sucessos. Como dito anteriormente, porém, a Whitney chegou ao posto de lenda da música devido ao seu inegável e gigantesco talento de interprete que começou a ser trabalhada desde o primeiro álbum dela, o homônimo Whitney Houston de 1985. E a partir dele que o mundo foi apresentado para a voz que marcaria várias gerações.

Para aqueles que não sabem ou se lembram, Whitney Houston não foi uma forasteira caindo de paraquedas no meio fonográfico. Filha de um veterano e empresário musical John Russell Houston, Jr. e da cantora gospel Cissy Houston, Whitney ainda tinha como primas Dionne Warwick e Dee Dee Warwick e como madrinhas Darlene Love e, claro, Aretha Franklin. Apesar de ter feitos alguns trabalhos como backvocal e gravado algumas canções como featuring, a então jovem Whitney entrou na carreira artística sendo modelo fotográfica até que foi "descoberta" pelo lendário produtor Clive Davis em 1983. Apesar do nome importante por trás e o seu imenso talento demorou cerca de um ano e meio para que produtores aceitassem trabalhar para no álbum debut. E, como conta a história, o resultado foi um dos maiores sucessos da década de oitenta e o álbum que deu a partida em uma das carreiras de maior impacto na indústria fonográfica. Entretanto, ao analisar friamente o álbum é possível chegar a conclusão que o principal motivo é a simples presença de Whitney Houston em todo o começo da sua glória.

Obviamente, boas músicas, um empresário com visão e uma produção bem feita é algo fundamental para o bom funcionamento de qualquer trabalho. Entretanto, a presença da cantora é algo tão gigantesca que em certos momentos parece que não existe mais nada que a própria voz. Afirmar a qualidade da voz daquela foi considerada a voz de toda uma geração e que irar se lembrada para sempre como uma das maiores é algo redundante ao extremo, mas é uma verdade que não canso de bater em cima. Só que o primeiro álbum apresenta algo que poderia ser um erro para outras cantoras: a imaturidade de Whitney. No auge dos seus 22 anos, a cantora era ainda uma novata comparada com as mulheres que a cercavam, mas existia um fogo que compensava boa parte dessa falta de experiência. E isso fica bem claro no álbum, pois Whitney entrega performances de uma força inacreditável que exalava uma ansiedade juvenil encantadora, provavelmente querendo provar o seu talento. Essa sensação poderia ser um tropeço imenso, mas se torna uma qualidade no instante que a cantora se mostra tecnicamente uma artista de outro nível. Carregando grandes baladas com a mesma facilidade que transbordava carisma em canções dançantes, a cantora soa consegue ter uma voz madura que transmiti esse tocante frescor de quem está ainda no começo da sua caminhada. Ouça a clássica Greatest Love of All e preste atenção a cada nota que a cantora entoa, deixando de lado as grande notas e o seus agudos. Tenho certeza que vocês capaz de sentir a inocência de uma jovem em busca o seu lugar no mundo. Apesar de ter tanto para oferecer, Whitney teve em mãos um material imperfeito para trabalhar.

Surgido em um período que cada vez mais crescia o crossover entre o R&B e o pop, o debut de Whitney foi construído exatamente nessa base ao ser uma mistura de soul, R&B e dance-pop. Trabalhando com importantes nomes dos dois gêneros daquela época, inclusive com Jermaine Jackson que é o irmão mais velho do Michael Jackson, o álbum é uma coletânea bem pensada, bem trabalhada e com uma qualidade técnica primorosa, mas que não foi capaz de dar uma personalidade sonora definida para cantora. Em especial, a parte mais pop dançante do álbum soa massificada e, depois de tantos anos, bastante datada. Tentando encontrar uma figura que pudesse ser a porta de entrada para a cantora em mercado mais amplo que o pop oferece, a produção esquecer que o talento vocal da cantora precisaria sobressair de qualquer batida. E isso não acontece em quase todas as faixas "animadinhas" até o surgimento da atemporal e brilhante How Will I Know. Leve, despretensiosa, romântica e com uma produção que soube respeitar a interprete ao deixar que a mesma brilhasse vocalmente em uma canção dançante, a canção se tornou o espelho para a produção de várias outras faixas da cantora com a mesma pegada. Apesar de acertar mais, o lado soul do álbum também não é algo 100% perfeito, pois preferiu não arriscar e entregar canções seguras para a cantora, deixando a mesma eleva-las apenas com a força da sua interpretação. Quando a produção ousou, Whitney teve em mãos uma das suas melhores baladas da carreira inteira: atualmente meio que deixada de lado por conta de outros grandes sucessos, Saving All My Love for You é uma avassaladora e corajosa balda power que mistura perfeitamente pop, soul e toque de jazz para criar algo inesquecível. Mesmo não tendo o mesmo impacto, outras duas faixas se destacam: a levemente sensual You Give Good Love e a dramática All At Once. Quase completando trinta e cinco anos de seu lançamento, Whitney Houston pode até ter traços que o tempo não foi tão bondoso com a produção de forma geral, mas ouvir Whitney em começo da sua plenitude vocal é uma experiência que sempre será uma experiência que compensa qualquer problema e que deve ser apreciado para sempre.