Luedji Luna
É acontecimento quase raro quando um artista consegue entregar, em pouquíssimo tempo de diferença, dois álbuns que não sejam apenas do mesmo nível de qualidade, mas que essa qualidade seja altíssima, como é o caso da Luedji Luna. Depois de deslumbrar com Um Mar Pra Cada Um, a cantora lançou o também deslumbrante Antes que a Terra Acabe.
Funcionando claramente como o segundo lado de um álbum duplo, o trabalho continua a esparramar a mágica sonora da artista, pois fica bem claro que é a continuidade direta do que ouvimos no primeiro lado. Na verdade, o resultado aqui fica um pouquinho acima, devido especialmente ao começo avassalador das primeiras faixas. Além disso, Antes que a Terra Acabe também apresenta uma leve, mas importante, diferença na construção sonora que faz certa diferença na percepção do trabalho ao ter uma carga mais proeminente de neo-soul/R&B e alguns gêneros bem brasileiros como, por exemplo, o axé e a bossa nova, deixando as influências de jazz um pouquinho de lado. Não é uma exclusão, mas, sim, um holofote mais explícito. É preciso dizer de maneira categórica que isso é apenas um apontamento para diferenciar os dois trabalhos, pois, no frigir dos ovos, o que temos diante de nós é um trabalho impecável e necessário de ser ouvido por quem gosta de boa música.
E, novamente, o grande destaque é a presença sublime de Luedji. Disse na resenha anterior sobre a cantora que a artista é “dona de uma persona refinada, atemporal e aveludada; a soteropolitana é uma artista esculpida do mesmo material de nomes como Sade, Luís Melodia e Erykah Badu”. Isso fica nítido como uma fonte de água cristalina durante todo o álbum. Se já podíamos imaginar que isso aconteceria, a cantora ainda encontra novos lugares para surpreender, acrescentando camadas à sua já grande força interpretativa.
Em Apocalipse, faixa que inicia o álbum, a cantora entrega uma performance deslumbrante que não precisa, em nenhum momento, de abusos vocais, pois toda a sua força emocional vem de se apoiar em sua graça natural e em seu timbre aveludado. O contraste com a voz gutural do Seu Jorge é o contraponto majestoso que eleva essa batida encorpada e mágica de soul/R&B com toques de pop e jazz. O álbum continua no mesmo nível altíssimo logo em seguida, quando surge a cativante e envolvente Pavão, em que a sonoridade dá uma guinada mais hip hop, especialmente com as presenças marcantes das rappers Mc Luanna e a estadunidense Rapsody. Graças à impressionante produção, a adição das duas artistas funciona perfeitamente, dando à canção substância sólida e graciosa, criando uma fluidez natural. Outro momento em que a mistura de estilos, idiomas e talentos funciona é na requintada e delicada bossa nova/jazz Bonita, que conta com a extraordinária participação da lendária Alaíde Costa.
Apesar de essas canções serem o crème de la crème do álbum por terem participações especiais, Luedji brilha por completo e sem ofuscamentos com sua presença em faixas como a irresistível Iôiô, o tempero apimentado e delicioso de Às Cegas, a batida cadenciada de Requinte e, por fim, a sensualidade refinada de Imã. Antes que a Terra Acabe mostra que o alcance da potência de Luedji Luna é algo transcendente e que parece estar longe de diminuir.


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