11 de maio de 2025

Primeira Impressão

A Complicated Woman
Self Esteem



Cerca de sete anos atrás, descobri o site Album of The Year, que serve como um agregador de críticas de especialistas e do público para álbuns e singles de praticamente qualquer artista, tanto internacional quanto nacional. Obviamente, nem sempre crítica e público conseguem falar a mesma língua, mas devo admitir que a diferença entre os dois nunca foi tão grande quanto em A Complicated Woman, da britânica Self Esteem. Esse parágrafo foi quase exatamente o mesmo para a resenha de Prioritise Pleasure, em 2021, e não poderia ser mais verdadeiro para o novo lançamento da cantora britânica.

Dessa vez, a situação é ainda mais extrema, pois, enquanto a média da nota da crítica é de sólidos 81 de 100, a média do público está em péssimos 38. São mais de quarenta pontos de diferença entre as duas notas, mostrando o imenso desfiladeiro entre as percepções. Os motivos para o público dar uma nota tão baixa ao álbum variam desde a crença de que parte dos críticos foi comprada para dar boas avaliações, passando pela noção de que o álbum não merece essas boas notas, até acusações de que a cantora é “woke” demais e, claro, a velha e boa misoginia. Essa é basicamente a nata das avaliações de parte do público.

Depois de ouvir o trabalho, termino tendo a mesma sensação que tive com o álbum anterior: nessa guerra, devo dar razão aos críticos, pois, apesar de não ser genial, A Complicated Woman é um grande trabalho e completamente inesperado em todos os momentos. Sim, o álbum trata de assuntos como empoderamento feminino e o peso de ser mulher na nossa sociedade, mas, primeiro, não é apenas isso que todas as canções abordam, e, segundo, o trabalho está bem longe de ser “too woke”, como acusam alguns. O que quer que isso realmente signifique.

Self Esteem é uma cantora com um estilo extremamente claro e muito bem definido para expressar sua visão, introduzindo seus ideais, suas ideias, seus sentimentos e suas emoções de uma maneira que torna bem transparente quem ela é e como deseja que o público a veja. Existe, sim, um lado que soa brega/piegas na construção de algumas das suas canções, mas, felizmente, tudo isso é usado a favor de expressar suas mensagens de maneira coerente com sua personalidade. Pode não ser para todos, mas passa bem longe de ser um trabalho digno de tamanho ódio. Na verdade, na minha opinião, existem momentos realmente de pura inspiração.

Logo no começo, o público já é contemplado pelo momento em que podemos ouvir Self Esteem em seu esplendor: I Do and I Don’t Care. A canção é uma crônica sobre os questionamentos da cantora em relação à sua imagem e como ela lida com as percepções que as pessoas têm dela. “If I'm so empowered, why am I such a coward?/ If I'm so strong, why am I broken?”, declama a cantora, mostrando vulnerabilidade ao duvidar se é forte o suficiente para lidar com tanta pressão. É honesta, sensível, poderosa e muito bem estruturada, mas é a excepcional produção que dá vida, de fato, às canções em A Complicated Woman.

Na canção citada, a produção entrega um grandioso alt-pop/synth-pop com pesados toques de gospel, ambient e bedroom pop, criando uma melodia atmosférica e épica que vai sendo trabalhada até atingir um poderoso clímax. E assim, a produção constrói todo o restante do álbum, criando uma sonoridade específica, estilizada e sempre surpreendente, que explora “todos os principais subgêneros pop que circulam atualmente”. Isso funciona melhor do que o esperado, pois há um controle total da produção, que consegue criar uma coleção muito bem amarrada de canções com uma fluidez impressionante.

Esse equilíbrio é importante para sustentar o álbum nos momentos de maior aventura sonora, como no caso de Mother. Uma mistura estilizada de tech house com dark pop e trip-hop, a canção é facilmente uma das piores avaliadas individualmente no site Album of The Year, especialmente devido à sua estrutura segmentada, à batida marcada e à composição feminista (I'm not your mother, and nor should you want me to be/Falling asleep on my chest is your fantasy/But where does that leave me?).

Outro momento controverso é a incursão da cantora em uma batida eletrônica com influências de ballroom/vogue na deliciosa 69, onde discute sua aversão à posição sexual homônima. Self Esteem, porém, também sabe seguir caminhos menos “polêmicos”, como deixa claro em Cheers to Me. Com uma batida mais tradicional de synth-pop/electropop/pop rock, a canção aborda o hábito de se apaixonar pelo mesmo tipo de pessoa, sabendo que os problemas serão os mesmos de antes. É desta canção o melhor verso do álbum, onde a cantora entoa no início do refrão: “When you're a sucker for a skinny mother fucker/I love 'em hard while they're texting another.” Irônica, divertida e honesta, os versos dão uma boa indicação de como é a personalidade da cantora. Outras faixas que merecem destaque são a atmosfera empoderada de Focus Is Power, a elegante Logic, Bitch, a minimalista In Plain Sight, a emocional What Now e, fechando o álbum, a interessante The Deep Blue Okay. E acho que a melhor finalização dessa resenha é exatamente a mesma do álbum anterior de Self Esteem: “o meu conselho é: ouça e tire suas próprias conclusões”.


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