20 de abril de 2019

Primeira Impressão

No Words Left
Lucy Rose


Quem acompanha o blog sabe que, normalmente, utilizo um tripé para avaliar canções e/álbuns: produção, composição e performance vocal. Acredito que quanto mais equilíbrio de qualidade estiver presente nos objetos resenhados, mais positiva será o resultado final. Claro que existem vários exemplos que um desses tripés se destacam mais do que os outros, mas isso é algo que nem sempre é bom já que pode deixar a canção e/ou álbum com algum tipo de desiquilíbrio. Existem alguns casos, porém, que conseguem quebrar essa regra como é o caso do novo álbum da britânica Lucy Rose, o majestoso No Words Left.

Chegando ao seu quarto álbum, Lucy Rose entrega um álbum que sonoramente é um certeiro, bem produzido e convencional indie pop/folk que tem como base instrumental uma coleção de canções à base de piano/voz/violão. Nada na sonoridade é algo que seja revolucionário, mas a produção acerta o tom ao criar uma atmosfera delicada, melancólica, madura e de uma sobriedade contemplativa realmente tocante. Obviamente, essa sonoridade não teria força suficiente para ser o grande atrativo de um álbum tão espetacular como No Words Left. O toque de genialidade aqui é a genialidade lírica de Lucy que faz do álbum um verdadeiro soco no coração faixa após faixa. No Words Left é sobre a insustentável leveza de ter esperança no amor. É sobre o pesado fardo de amar apenas para se machucar. É sobre ser deixado de lado. É sobre destruir o coração de alguém com uma marreta nas mãos e uma lágrima no rosto. No Words Left é sobre saber como ser e não saber como ser amado. É sobre cair. É sobre levantar. É ter medo e ser corajoso. É sobre ser a vítima e o vilão em uma relação. É sobre ser amado e se sentir sozinho. Sobre o silêncio ensurdecedor e calmo barulho.  No Words Left é, essencialmente, sobre ser um ser humano. E, queridos leitores, não existe algo mais simples e ao mesmo tempo tão complexo de escrever, mas Lucy entrega uma coleção de trabalhos que, até podem não ser perfeitas, refletem de forma sinceramente enternecedor. Para tanto, porém, a cantora não se precisa a recorrer as "palavras difíceis" para alcançar tal feito.

Em nenhum momento Lucy precisa se basear em construções rebuscadas ou de uma complexidade pretensiosa nas elaborações das imagens. No Words Left é liricamente uma tempestade silenciosa, pois, a primeira vista, parecem apenas letras açucaradas sobre sentimentos. Então, de repente o olho o do furação atinge em cheio e quem ouve começo a entender a densidade emocional de cada faixa. É algo que fazia algum tempo que não tinha o privilegio de experimentar. Acredito que algumas linhas da minha resenha do maravilhoso single Conversation ajudam a entender melhor o impacto de forma geral de todo o álbum: "Conversation é uma melancólica, delicada e, por vezes, devastadora balada indie pop sobre as lutas e as pequenas batalhas de estar um relacionamento. Contida em palavras, mas com com um leque de emoções atrás de cada palavra, Conversation é o tipo de canção que faz a gente ser retirado do chão em transe hipnótico ao ouvir e sentir toda a sua força emocional." E a faixa é apenas a primeira do álbum, deixando o caminho aberto para outros momentos de mesmo impacto. Enquadram-se nesse caso duas faixas: Treat Me Like a Woman é uma voraz e desconcertante crônica sobre o desrespeito que uma mulher está vivendo em um relação conturbada e a melancolicamente esperançosa Nobody Comes Round Here sobre se deixar dar uma chance para a vida e, claro, para o amor. Dona de uma voz tão delicada como a primeira brisa morna de primavera após um longo inverso, Lucy entrega performances que captam exatamente o sentimento de cada faixa em uma mistura de bondade, contemplação, desalento e uma quase esperança. Outras faixas de destaque ficam por conta da triste Solo(w) sobre a parte que falta na gente e a esmagadora sensação de solidão, os lados de um fim do amor em What Does It Take e o alento final na linda Song After Song. Sem precisar de uma grande produção, Lucy Rose entrega um álbum que consegue ser maior que parecer ser devido a genialidade em escrever letras que transcendem o próprio álbum.


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