18 de agosto de 2020

Primeira Impressão

Petals for Armor
Hayley Williams


Quando comecei o blog há mais de dez ano não tinha a menor chance de gostar do Paramore e, por consequência, da sua vocalista Hayley Williams. Achava a música da banda rasa, pouco criativa e completamente descartável. O tempo passou e aos poucos, a banda foi amadurecendo em algo que era o oposto da minha reação inicial: excitante, interessante e criativa. Apesar disso, a banda não se tornou permanente nas minhas playlists, ficando a margem e restrito nas minhas resenhas aqui para o blog. Por isso, a carreira solo da Hayley Williams não gerou muita comoção da minha parte até o momento que ouvir os primeiros singles lançados. E, queridos leitores, alguma chave interna mudou, pois a minha expectativa aumentou imensamente. A situação triplicou ao ouvir a prévia/EP que mostrou as cinco primeiras faixas do álbum. Apesar de já ter sido lançado há algum tempo, ouvir Petals for Armor foi um alento caloroso para as minhas altas expectativas: apesar de algumas falhas aqui e ali, o primeiro álbum solo de Hayley Williams é uma obra espetacularmente complexa e de uma beleza rara nos dias de hoje.

A grande sacada do álbum é conseguir soar como uma sequencia da sonoridade que a Hayley estava fazendo com o Paramore nos últimos anos e, ao mesmo tempo, começar a construir uma sonoridade sólida e única para a carreira solo da vocalista. Esse feito é algo incrível e nada comum já que a maioria esmagadora de casos de integrantes de banda/grupos quando começam a carreira solo querem de alguma forma se distanciarem da sonoridade feita anteriormento, indo para algo totalmente pessoal. Em Petals for Armor, porém, Hayley Williams dá o dedo do meio para essa regra ao contar com Taylor York, guitarrista companheiro de banda, para co-escrever várias canções e, principalmente, produzir todo o trabalho. Felizmente. como dito antes, o álbum também é a porta de entrada para o começo da elaboração da sonoridade da cantora de forma eficiente. Por isso, não é exagero falar que o álbum é tem essa complexidade única que consegue amarrar duas pontas opostas de forma espetacular ao não pesar para nenhum lado em uma simetria finíssima. 

Dessa bela união, Petals for Armor resulte em um maduro, denso e muito bem elaborado trabalho de indie pop/rock que consegue ficar perfeitamente na fronteira entre o mainstream e o experimental. Hayley e o produtor criam uma sonoridade que remete a trabalhos de diversos nomes do panteão do indie/pop, especialmente o Radiohead, que pudesse ser melhor absorvido por ouvintes casuais sem perder a sua essência básica. O resultado pode parece algo não orgânico, mas essa sensação é facilmente dispensada pelo espetacular trabalho instrumental apresentado durante todo o álbum. E não há exemplo melhor que a impressionante força de Simmer, canção que abre o álbum. Em sua resenha escrevi que "logo nos primeiros acordes de Simmer já pode se perceber que a canção é algo que demanda a sua atenção, resultando em um experiência que transita do inspirador ao claustrofóbico. E isso, leitores, é algo extremamente positivo. Sonoramente, o single é um maduro e dark indie rock/pop que tem na sua batida discreta o ponto certo para criar uma canção poderosa. Sem nenhum arrombo sonoro, mas com uma batida contida e complexa, Hayley consegue envolver quem ouve em uma viagem poderosa ao criar uma sensação que estamos diante de uma verdadeira art pop.". Acredito que essa passagem possa ajudar a entender qual a pegada da instrumentalização geral de Petals for Armor ao ir por um caminho low profile, contida e com flertes fortes com o minimalismos. E é aqui que entra o grande problema do álbum.

Trabalhando em uma cadencia parecida para boa parte das canções ao terem atmosferas densas, restritas e com uma base fortemente associadas a instrumentos de percussão, Petals for Armor se torna uma grande e quase continua  coleção de canções de uma sonoridade pesada e sem muitas nuances. E quando falo de nuances não é sobre mudar a sonoridade e, sim, adicionar uma paleta de cores e texturas na construção para dar ainda mais profundidade. O bom do álbum é que essas injeções de criatividade aparecem em alguns momentos, aliviando a pressão criada e elevando o material. O momento mais surpreendente do álbum e que confirma essa minha opinião é a ótima eletrônica/disco/indie pop Sugar on the Rim que parece ser saída de um álbum da versão no mundo invertido da Robyn. Outro momento interessante é a batida levemente inspirada na new wave que o Paramore abraçou nos dois últimos álbuns em Dead Horse. Diluídas durante o álbum inteiro, faixas como essas também sofrem de um outro problema que parece ser constante atualmente: a duração exagerada de álbum. 

Petals for Armor apresenta quinze faixas divididas em três blocos, lançadas como EP's anteriormente, com uma duração total de quase uma hora. Apesar de não fugir muito do que se tem visto em lançamentos ultimamente, o álbum poderia facilmente ter uma duração menor com o corte de algumas faixas. Duas ou três seriam suficiente para elevar ainda mais o resultado final, pois como está o álbum pode soar arrastado e entediante para algumas pessoas. Em especial para aquelas que não embarcaram nessa jornada de Hayley Williams. Para aqueles que se deixaram envolver, o álbum tem momentos de pura inspiração como a indie/pop Sudden Desire e a sua atmosfera sensual e empoderada ao falar sobre a aceitação de Hayley da sua sexualidade. Íntimo, extremamente bem escrito e com uma história que flerta com o conceitual, Hayley consegue criar no álbum quase como um diário de crônicas sobre os seus mais aflitivos sentimentos e as suas emoções latentes sobre variados temas que vão desde as experiência da cantora com luto (Leave It Alone) até uma ode sobre o conforto e a segurança da sua casa (Cinnamon), passando pela força de uma amizade (My Friend) até a capacidade de se reinventar após o período sombrios (Watch Me While I Bloom). Liricamente, a complexa e densa Roses/Lotus/Violet/Iris que usa de metáforas sobre flores para falar sobre empoderamento feminino é um trabalho edificante e de uma maturidade plena. Todavia, os melhores momentos liricamente ficam por faixas que tocam sobre assuntos ainda mais abrangente é a delicada e quase melancólica Why We Ever sobre tentar entender o motivo por deixarmos certas coisas no passado e Pure Love sobre a busca de todos para se sentir amado e desejado. Petals for Armor termina como um trabalho com falhas fáceis de serem corrigidas, mas sendo, principalmente, um começo avassalador de uma carreira solo promissora para uma Hayley Williams ainda em descoberta do seu alcance como artista.

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