10 de abril de 2022

Primeira Impressão

CRASH
Charli XCX




Acredito que no futuro será possível observar que a Charli XCX lançou uma trilogia de álbuns que faz uma crônica sobre o pop em várias das suas facetas, apesar de não ter sido essa intenção original. Começou com o arrasa quarteirão de Charli de 2019, “um trabalho quase perfeito do mais puro, comercial e tradicional electropop e o mais refinado e inovador trabalho de avant-pop que beira o art pop”, passando por how i'm feeling now de 2020, “um dinâmico, orgânico e rico electropop/pop experimental que desafia expectativas em uma produção que parece brincar com os limites da sua própria sonoridade” para terminar em CRASH é literalmente a mistura/fusão de ambos os trabalhos com um resultado dinâmico e essencialmente divertido.

Enquanto os dois álbuns anteriores pendiam para um lado da balança entre o pop comercial e o pop experimental, CRASH fica exatamente no meio desse equilíbrio ao entregar um acessível, leve, requintado e inteligente trabalho de synth-pop/electropop. Com uma produção que é basicamente o quem é quem do atual cenário eletrônico/pop/indie (A. G. Cook, Digital Farm Animals, Ariel Rechtshaid, Oneohtrix Point Never, Ian Kirkpatrick, entre outros), o álbum é construído para as canções possam serem de fácil compreensão para qualquer público ao ter esse toque pop vendável e, ao mesmo tempo, adicionar uma camada brilhante o suficiente para continuar a fazer a Charli XCX um balsamo de originalidade nos pântanos da mesmice do atual cenário. O cuidado como cada pequeno detalhe dessa construção é colocado para que o resultado final seja sempre espetacular é impressionante. O single Good Ones é a prova cabal dessa característica da artista: “a formula para que Charli consiga sair do lugar comum em relação a massa é adicionar suas referências sonoras aqui e ali, criando uma batida encorpada, refinada e levemente sombria”. CRASH também não seria tão bom se não tivesse uma influencia tão bem estabelecida e costurada dos anos oitenta/noventa/dois mil.

É obvio que isso é não é nenhuma novidade, especialmente depois da onda de renascimento do post-disco dos últimos anos. Entretanto, a maneira que CRASH apresenta é de uma naturalidade impressionante sem nunca soar pretencioso ou/e datado. Todo aqui é feito na precisão milimétrica. Não é cópia barata, mas reflete perfeitamente toda uma vibe. Não é nostálgico demais, mas consegue fazer a gente sonhar com épocas mais simples. Não busca uma revolução, mas consegue adicionar camadas que dão originalidade para a sonoridade. Um dos principais momentos que fazer a gente reconhecer essa qualidade é a ótima parceria com a Rina Sawayama em Beg For You “um veículo perfeito para as duas no instante que resulta em algo que parece realmente um trabalho feito para usar as melhores qualidades de ambas. Sem pender para nenhum lado, a canção se utiliza da química das duas para criar uma canção fluida e deliciosamente excitante. (...) A batida electropop que emula o começo dos anos dois mil é deliciosamente nostálgica, especialmente devido ao uso do sample de Cry for You da cantora Petra Marklund de 2006”. Isso também acontece na irresistível Baby ao ser “um hibrido criativo, distinto e levemente esquisito de dance pop com toques de new wave e electropop que parece ter saído exatamente deu um limbo entre a transição dos anos oitenta e noventa”. Uma pena que o álbum decaí na sua parte final. Conhecida por sempre manter uma coesão do começo ao fim, Charli peca ao incluir canções mid-tempo que funcionam como as baladas do álbum que, infelizmente, não parece conectar de forma verdadeira com o resto do álbum, criando um tropeço que tira algum brilho do resultado final, tirando a deliciosa retro synthpop Yuck. Felizmente, antes desse desvio final, CRASH entrega algumas perolas. Começa pelo ótimo single New Shapes com participações de Christine and the Queens e Caroline Polachek ao ser uma deliciosa, sexy e dançante synthpop com os dois pés enfiados nos anos oitenta que poderia facilmente ser uma regravação/remix de uma canção da década, Constant Repeat e a sua batida electropop com toques de EDM/hip hop, a batida R&B/pop de Move Me e, por fim, a eletrônica/synth-pop Lightning sendo a mais experimental do álbum. CRASH não é o melhor álbum da carreira da Charli XCX, mas fecha com chave de outro um ciclo que fez a cantora ser um dos melhores nomes do pop contemporâneos.


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