31 de dezembro de 2023

Primeira Impressão

Javelin
Sufjan Stevens





O décimo álbum da carreira do aclamado Sufjan Stevens é uma tocante crônica sobre o ciclo do amor, indo do seu começo ao fim. E Javelin ganha ainda mais relevância devido a ter sido dedicado ao seu falecido companheiro.

Apesar da profundidade do seu contexto e construção lírica, o trabalho nunca é exatamente emocionante e, sim, emocional. Stevens nunca pende para a emoção direta ao discorrer sobre vários estágios do amor. O que é feito é uma reflexão sóbria, madura e sempre inteligente que conquista pela delicadeza em que retrata cenas cotidianas em que sabe dosar as construções de imagens que recorrem a várias referências complexas com as construções de versos despidos de significação elaboradas parasse concentrar em uma honestidade simples e direta. E, queridos leitores, essa maestria em poder falar de sentimentos tão complexos de uma forma que mostra claramente a sua habilidade de compositor sem parecer despudoramente pretencioso e/ou querer emocionar pelo simples fato de emocionar é o que faz de Javelin um dos grandes álbuns de 2023. Sonoramente, o álbum também é um grande acerto, mesmo tendo pontos que podem não funcionar para todos.

Em resumo, o álbum é uma mistura encantadora, adulta, refinada e coesa de indie rock, folk e indie pop que cria uma sonoridade que está longe de ser nova, mas, sim revigorante e muito bem feita. Como produtor único do álbum, Sufjan Stevens tem uma visão muito clara sobre o que deseja e, principalmente, como ajeitar as peças da sua própria sonoridade para criar a perfeita fluidez. Com uma construção instrumental excepcional, Javelin não é um trabalho para todos, pois é até fácil perceber que a cadencia lenta e a sua personalidade bem definida é algo que deve não ser exatamente atrativos para um público que procure algo mais potente sonoramente ou que tenha uma visão mais rasa sobre a música. Entretanto, quem realmente se interessar pelo álbum estará se deleitando em cada pequena surpresa que o artista vai tecendo ao longo da duração do álbum seja sonora, lírica ou devido ao seu incrível trabalho vocal. Em um dos seus grandes momentos, o álbum entrega a grandiosa e “dreamy” Shit Talk com seus oito minutos e meios que nos levam a navegar pelo entendimento que entender que o fim de amor nem sempre precisa ser algo devastador e, sim, a gente perceber que é apenas hora de parar de tentar. Abrindo o álbum, Goodbye Evergreen também é sobre o fim, mas são os momentos angustiantes e temerosos que antecedem a contemplação da canção anterior e por isso o instrumental é mais robusto e pesado. E apesar de nunca falar diretamente sobre a sua perda pessoal é possível sentir a presença dessa dor durante todo o álbum, mas acredito que a mais representa essa reflexão é na linda My Red Little Fox em que o cantor entoa no refrão:

My love, my queen, my broken
Dreams come save me
Kiss me like the wind
Now I sing it won't you

Outros momentos importantes do álbum ficam por conta da aveludada A Running Start, a linda e melancólica Genuflecting Ghost sobre aproveitar o momento antes do fim e a devastadora So You Are Tired. Javelin é o tipo de álbum que vai entrando na gente aos poucos, mas deixa uma marca imensa devido ao talento de Sufjan Stevens em criar uma força invisível e de um poder desconcertante. 

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