3 de outubro de 2021

Primeira Impressão

MONTERO
Lil Nas X




Quando escrevi na resenha de Setembro de 2019 apontei que o Lil Nas X “(...) ainda está longe de colocar a sua marcar na indústria, mas, como demonstra o EP 7, o rapper parece ter o que mostrar de fato”. Um pouco mais de dois anos depois, o artista lança o seu primeiro álbum completo para não apenas realmente mostrar o que tem, mas, principalmente, colocar a sua marca definitiva dentro da indústria. Entretanto, MONTERO é também um explosivo, divertido e redondíssimo álbum pop que consegue entrar na mesma categoria de grandes momentos do gênero ao ser o blockbuster perfeito para o atual cenário musical.

É preciso dizer que MONTERO é, na minha opinião, o final perfeito e apoteótico de um ciclo de nascimento recente da capacidade de artistas queers contemporâneos conseguirem espaço não apenas com a crítica, mas, principalmente, dentro do mainstream. Apesar de tido outros nomes que alcançaram o sucesso como, por exemplo, Frank Ocean e Sam Smith, Lil Nas X chega em patamar midiático que normalmente sempre foi destinado para artistas brancos. Com uma intensa e eficiente campanha de promoção que mirou na cartilha de nomes como Madonna e Lada GaGa, mas sem perder a sua personalidade, o rapper quebra barreiras que alguns anos nem sonhavam em cair ao ser um homem negro e gay no topo do mundo pop, sendo apontado como o maior astro pop da atualidade. Histórico e icônico, MONTERO poderia não cumprir a expectativa em questão de qualidade, mas, felizmente, o álbum chega deixando claro que estamos diante de uma força criativa de respeito.

Comparo o debut de Lil Nas X com o Born This Way da GaGa, pois ambos são obras pop de força comercial imensa, capacidade para dar uma guinada no pop, produção explosiva que apresenta altos e baixos e uma base vinda unicamente do carisma de seus donos. Entretanto, existe uma diferença entre os dois álbuns importante: GaGa entregou vários momentos perfeitos com alguns tropeços realmente marcantes enquanto Lil Nas X pode não chegar pertos desses momentos de nirvana pop, mas apresenta um trabalho de coesão impecável do começo ao fim. Com cerca de quarenta minutos e contendo quinze faixas, MONTERO é uma metralhadora rápida, certeira e edificante em que o público agraciado por uma mistura excitante de pop, rap, hip hop, R&B, pop rock/punk, country e trap. Essa profusão de gêneros poderia facilmente cair na pilha do genérico/datado, mas isso é facilmente colocado de lado devido ao verniz realmente brilhante que dá a liga para cada canção e consegue unir todas as faixas de maneira orgânica. Apesar de trabalhar com alguns nomes, o principal responsável pelo tom e dinâmica do álbum é o produtor Take a Daytrip. Trabalhando em quase todas as faixas, o produtor parece saber muito bem como tratar o rap/hip hop com os olhos do pop e como adicionar ao pop as nuances que dê para Lil Nas X personalidade distinta e única. Em MONTERO (Call Me By Your Name), “o grande ponto positivo da canção é a sua refinada e inteligente produção que saber misturar hip hop com electropop com toques de flamenco, country, trap e latin music em uma batida direta, divertida, carismática, comercial e com força suficiente para poder conquistar críticos mais exigentes”. Dolla Sign Slime, parceria com a Megan Thee Stallion, poderia facilmente ser apenas mais um trap repetitiva, mas as camadas pop ajudam a dar nuances suficiente para criar uma canção realmente interessante. Apesar desses ótimos momentos, o grande destaque de MONTERO é a sensacional Industry Baby ao ser “uma excitante e encorpada mistura de rap e pop que acerta na mosca em uma produção que consegue ter força criativa e ser comercial na medida certa”. Entretanto, o álbum se sustenta não apenas esteticamente, pois, assim como grandes nomes do pop, Lil Nas X tem uma mensagem para passar e faz isso de maneira incrível.

Muitos acham que vários astros/divas pop apresentam apenas estética como principal meio de sucesso com seus públicos, mas, na verdade, existe uma profunda conexão emocional e de importância única que são capazes de fazer verdadeiras revoluções culturais. Madonna talvez seja o nome que vem na minha mente que tem essa característica. Apesar de ser conhecida por suas reinvenções de imagens e momentos polêmicos, a cantora sempre mostrou no seu ápice um talento para entregar composições que tinham significado real, indo bem mais longe que o que o se via. Mais recentemente, a Beyoncé conquistou em espaço de forma ainda mais direta com o lançamento de Lemonade. Em MONTERO, Lil Nas X pode não chegar nesses ápices, mas aqui ouvimos um artista capaz de ter realmente para algo a dizer.

As suas experiências como um homem negro e gay são a força motriz de várias composições que surpreendem por serem emocionalmente verdadeiras. Sem medo de expressar a sua sexualidade assim como seus dilemas emocionais, Lil Nas X entrega momentos de uma qualidade realmente acima da média seja pela temática quanto pela escrita. Em VOID, uma balada pop rock lindamente instrumentalizada, o artista faz uma tocante crônica sobre solidão e a pressão de se sentir sozinho na multidão. Life After Salemm é uma power balada pop rock/punk que relata o fim de um romance do artista devido ao mesmo se sentir usado e desvalorizado. Lendo as entrelinhas não tão secretas assim dá para perceber que a letra é sobre um relacionamento em que, provavelmente, o outro vivia uma vida dupla devido ainda não ter sua sexualidade explicita. Esse é a experiência de milhares de pessoas queers que não conseguem viver plenamente suas vidas amorosas devido ainda serem atormentadas pelo “fantasma do armário”. Transitando entre várias facetas possíveis que o álbum percorre, Lil Nas X se mostra uma força da natureza consegui carregar todas as canções independente dos seus rumos sonoros, indo do astro pop rock romântico em That's What I Want para o astro do R&B/trap em Don't Want It para cantor country/folk de Am I Dreaming em parceria com a Miley Cyrus. O único momento de tropeço é One of Me que, apesar de ser uma boa canção, desperdiça a lenda Elton John apenas como “tocador de piado”. De qualquer forma, MONTERO é uma consagração de um astro pop que já deveria ter surgido muitos anos atrás, mas, felizmente, Lil Nas X veio com força total para ocupar esse espaço de maneira incontestável.

Um comentário:

Tiago disse...

Finalmente heheheeh, entro todo dia pra ver se tem algo novo. Apesar de vc lamber tudo que a Beyonce faz, e nenhum artista ser do nível dela pra vc... hehehe eu gosto das tuas análises.

Tava com saudade de ler.

Obrigado, e desculpe a brincadeira hehehe , mas sigo sempre voce aqui.

Abraço