10 de novembro de 2021

Primeira Impressão

Cavalcade
black midi



A música, assim como todas as artes, foi criada para que a humanidade pudesse expressar emoções e sentimentos, ajudando as pessoas a entenderem a complexidade quase infinita da vida. Entretanto, muitas vezes esquecemos que a música não serve apenas para fazer a gente se lamentar pelo coração quebrado ou entrar nas boas vibrações depois de um dia de estresse. A música serve também para incomodar, tirando a gente do local de conforto sem necessariamente ter um local de chegada predestinado. Ouvir Cavalcade, segundo álbum da banda britânica black midi, tem basicamente essa função ao ser um turbilhão de sensações que fazem quem ouvir levitar emocionalmente.

Tentar definir especificamente qual a sonoridade de Cavalcade é tentar desenrolar um novelo complexo e intricado de dezenas de influências que passam por vários gêneros. E é por isso que apontar o álbum como uma mistura de avant-rock com um importante base jazz fussion é o que melhor exprime a jornada que a banda nos leva em cerca de quarenta minutos de puro frenesi sonoro. O mais impressionante é que mesmo quando a banda desacelera o ritmo tudo ainda soa frenético e incontrolável. Acredito que para saber se você irá gostar do trabalho como um todo é necessário ouvir apenas as duas primeiras faixas, pois passado o susto de tamanho impacto causado pelo resultado da combinação de dois extremos fica mais fácil embargar nessa viagem. Tudo começo com a épica e sufocante da explosão que John L em a sua montanha russa instrumental.

Construída sobre ferro e fogo, a canção é abre alas completamente devastador que caminha entre o sublime e o desconcertante na mesma medida que deixa um gosto estranho devido as suas mudanças instrumentais e de cadencia. Então, logo em seguida surge a doce e poética Marlene Dietrich e sua linda homenagem a atriz ícone alemã. Com uma provável influência da bossa nova permeando a produção, a canção é literalmente o oposto de John L, criando um começo estranho e espantoso que ajuda a entender um pouco da força que o black midi impõe em todos os momentos do álbum. Todavia, isso não é ainda todo o escopo de Cavalcade consegue atingir, pois o trabalho ainda guarda alguns momentos realmente de cair o queixo.

Como disse anteriormente, a música também serve para incomodar e a banda não tem medo de instigar com brasas os nossos sentidos. Por vezes durante a execução do trabalho fiquei realmente inquieto, confuso, intrigado e, claro, incomodado perante toda a loucura que estava presenciando. Sem necessariamente querer encontrar respostas, o black midi parece querer menos levantar pontos de interrogação sem precisar levantar uma pergunta no final das contas. E, mesmo assim, tudo parece se encaixar quando a gente olha o quadro geral, pois parece que, assim como na vida, existe uma coerência na loucura. Outro aspecto que ajuda o álbum realmente ter uma força solidificadora é que sonoramente existe um aspecto cinematográfico. Em seu momento mais genial, o álbum entre a climática Diamond Stuff que em um pouco mais de seis minutos consegue parece com uma versão moderna de uma trilha do lendário Ennio Morricone. E é claro que a parte instrumental é simples apoteótica do começo ao fim não deixando espaço para qualquer espaço para vazios narrativos e /os sonoros. Entretanto, a grande cola que faz Cavalcade chegar no seu patamar é a performance tour de force do vocalista Geordie Greep que entrega momentos que conseguem ir plenamente do total descontrole performático até a delicadas e sentimentais apresentações, conseguindo navegar entre tudo que existe entre esses dois de maneira esplendorosa. Na ascendente Dethroned, o vocalista que ainda nem atingiu os vinte e cinco anos direitos consegue manifestar esses dois pontos com uma magistralidade acachapante. E depois entre no modo melancólico para entoar a suave Ascending Forth em uma performance que parece carregar o peso de toda uma vida bem mais vivida que a do vocalista. Ouvir Cavalcade é como levar um soco na cara sem nenhum motivo aparente, mas que a gente de tempos em tempos parece precisar.

Nenhum comentário: