26 de novembro de 2021

Primeira Impressão

Sometimes I Might Be Introvert
Little Simz




Quando ouvi pela primeira vez o álbum GREY Area em 2019 já tinha certeza que a Little Simz era uma artista simplesmente genial. Apesar dessa certeza ainda fiquei chocado com o resultado de Sometimes I Might Be Introvert, pois a rapper se eleva para um patamar tão alto que fica até difícil escrever uma resenha que consiga expressar em palavras tudo que realmente penso dessa obra prima.

Se tivesse que definir em apenas uma palavra que pode expressar de alguma forma a sensação de ouvir Sometimes I Might Be Introvert é espetacular. Não apenas como adjetivo, mas também com a sua palavra de origem: espetáculo. Com dezenove faixas e mais de uma hora de duração, o álbum tem essa qualidade que beira o cinematográfico devido a sua grandiosidade impressionante desde o primeiro segundo até o seu último momento assim como um épico urbano. Não estamos diante de uma obra que quer ser grande, mas, sim, uma obra que se impõe de forma natural como tal sem soar em nenhum segundo como pretenciosa ou parecer que está dando um passo maior que pode alcançar. Sinceramente, poucos álbuns que escutei teve essa capacidade sem se perder em nenhum momento. Acredito que apenas Kendrick Lamar em good kid, m.A.A.d city (2012) e To Pimp a Butterfly (2015) alcançou esse feito e, mesmo assim, o trabalho de Little Simz tem algo que esses álbuns não possuem: apenas um produtor.

Dean Josiah Cover, conhecido como Inflo, produz todo o álbum com apenas duas faixas tendo um coprodutor cada. Repetindo a parceria de GREY Area com Little Simz, o produtor é capaz de criar uma das mais complexas, suntuosas, intrigadas, ricas e genais construções sonoras dos últimos tempos ao entregar uma fusão dinâmica, impressionante e vigorosa de hip hop, rap, soul, neo soul, jazz e R&B que consegue ter uma fluidez perfeita entre todas as mudanças e nuances dessa jornada. Não existe literalmente um momento que Inflo se perca em sua construção extremamente clara e precisa sobre qual o rumo tomar, mesmo tomando decisões arriscadas para adicionar nuances, camadas e texturas para o resultado final de Sometimes I Might Be Introvert. Essa genialidade sonora é tão impressionante que até mesmo as faixas interludes (quatro ao total) também ganham destaque no mesmo nível que as faixas “completas”. Essa precisão cirúrgica que se alinha com uma visão artística de Inflo é algo de uma genialidade tão impressionante que cria a base perfeita para que cada canção do álbum possam ser trabalho que transitam entre o sensacional até o sublime sem tropeços, erros ou mesmo a sensação de serem apenas boas. Canções completamente diferentes uma da outras, mas todas simplesmente geniais. E tudo começa com Introvert que consegue ser melhor que todas as canções da carreira de vários artistas por aí.

O resultado final de Introvert encontra o seu lugar devido ao poder de Little Simz, pois a rapper injeta uma tonelada de personalidade única em uma performance avassaladora e de uma emoção honestamente crua. Sem enfeites desnecessários, a canção conta com os vocais delicados de Cleo Sol durante o refrão e a voz off da atriz Emma Corin, conhecida pela sua interpretação da princesa Diana na série The Crown. E a canção chega ao seu ápice devido a sua genial composição de uma verborragia avassaladora e necessária, a rapper entrega uma crônica espetacular que consegue emocionar e fazer a gente pensar sobre demônios internos, violência policial, racismo, corrupção e empoderamento”. Se Sometimes I Might Be Introvert fosse apenas a sua canção abre alas já estaríamos diante de um dos melhores álbuns do ano, mas Little Simz continua a sua saga por mais dezoito faixas como a força de uma artista que no ápice de seu talento que consegue aproveitar de cada gota para construir um oceano.

Falar que a rapper Simbiatu "Simbi" Abisola Abiola Ajikawo, nome de nascimento de Little Simz, entrega performances que valem por toda uma vida é simplesmente chover no molhado, mas é preciso apontar que a força da rapper é algo desconcertante até mesmo para alguém que já conhece a carreira dela. E isso é visto continuamente por todo Sometimes I Might Be Introvert não importando qual o “estilo” de cada canção. Na empoderada Woman, a rapper entrega uma “performance extremamente relaxada sem nunca ser desinteressada ou desinteressante, se apresentando novamente com uma rapper amadurecida e dona de uma capacidade de se moldar em diferentes direções dependendo do material em mãos”. Enquanto em Standing Ovation, a rapper entrega uma performance completamente direta com uma incrível adição de nuances que adiciona apenas mais força para o resultado final. E essas performances são acompanhadas por composições que realmente deixam bem claro o talento de Little Simz de maneira sem contestação.

Verborrágica, poética, honesta, brilhantemente construída, surpreendente e impactada, a lírica da rapper é sempre um trabalho de feito de maneira quase artesanal, pois é possível notar um cuidado meticuloso com a elaboração de versos e refrãos. E é um trabalho imenso já que a rapper não tem medo de criar grandes composições que se equiparam com as grandes bases sonoras que as sustentam. Quase como uma balada soul/hip hop/jazz, How Did You Get Here é uma crônica tocante e emocionante sobre o caminho da rapper para alcançar o lugar que está pessoalmente e artisticamente. Sem em nenhum momento soar pretenciosa, Little Simz se mostra uma compositora inteligente e dona de uma menta afiada para passar claramente a sua mensagem, indo de assuntos pessoais até políticos com a mesma qualidade lírica. O melhor momento nesse requisito fica por conta de I Love You, I Hate You que “apresenta uma das composições mais brilhantes dos últimos tempos, pois consegue ser tecnicamente perfeita e de uma força emocional descomunal ao mostrar uma vulnerabilidade tocante de uma pessoa em busca de resposta para o motivo de ter o que deveria ser o relacionamento mais importante completamente despedaçado. Transitando entre o emocionalmente melancólico (Never thought my parent would give me my first heartbreak) para o devastadoramente sincero (And wish than be faced with this reality/ Is you a sperm donor or a dad to me?), Little Simz entrega uma performance com a mesma força, deixando claro que a rapper encontra-se no seu melhor momento da carreira ao alcançar um patamar que, sinceramente, nenhum outro rapper nesse momento parece estar nem perto”. Normalmente quando estou ouvido um álbum sempre faço notas para ter um “mapa” para escrever minhas resenhas que também inclui quais as canções de destaque do álbum, mas Sometimes I Might Be Introvert percebi que coloquei todas as canções do álbum como destaque. As citadas aqui são aquelas que está um passo a frente entre canções que já são o suprassumo da genialidade. Realmente tentei expressar todas as minhas emoções em relação ao uma verdadeira magnum opus entrega pela Little Simz, mas acredito que a melhor demonstração da minha admiração é dar a maior nota possível para um álbum resenha aqui no blog. E assim, senhoras e senhores, nasce um clássico.

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