25 de dezembro de 2018

Primeira Impressão

A Brief Inquiry Into Online Relationships
The 1975





De tempos em tempos surge um álbum que consegue explicar a juventude da sua época que é lançado. Álbuns como Nevermind do Nirvana, Dookie do Green Day ou, até mesmo, o Let Go da Avril Lavigne apresentam essa característica ao conseguirem de formas diferentes expressarem o espírito que a juventude daquele momento da história, seja através da sonoridade ou das reflexões inclusas nas composições. Nem sempre, porém, esse álbum irá ser um sucesso imenso de vendas como foram os exemplos citados, mas só pelo seu conteúdo relevante já é suficiente para colocar um álbum nessa categoria. Em 2018, o mais novo álbum que entrou nesse hall é o terceiro álbum banda britânica The 1975: A Brief Inquiry Into Online Relationships é um relato certeiro e instigante sobre a geração dos millennials.

Donos de uma carreira que já tinha chamado atenção desde o primeiro álbum e que alcançou novos níveis com o lançamento do segundo álbum, o The 1975 dá um passo a frente com o terceiro trabalho ao elevarem a sonoridade deles como, também, refletirem e criticaram profundamente sobre o que pensa os millennials. Algo parecido já tinha sido feito pela Lorde em Melodrama, mas aqui ganha contornos mais dramáticos devido a banda apontar sem medo os principais problemas e pensamentos dessa geração. É necessário dizer que boa parte dos temas não são exatamente estranhos para qualquer geração, pois, sejamos sinceros, já dizia a canção "ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais". O que muda, na verdade, é como essa geração encara assuntos como, por exemplo, corações quebrados, solidão, depressão, desejos reprimidos, separações, sucesso profissional e paixões avassaladoras. Sob a geração da tecnologia em primeiro lugar, essa geração quer tudo de uma mais vez só e o mais rápido possível, mesmo não tendo a menor ideia de como conseguir alcançar, ou melhor, achando que sabe. É nesse contexto que aparecem as composições de A Brief Inquiry Into Online Relationships

A primeira dica que o álbum irá enveredar por esse caminho vem logo de cara com o título A Brief Inquiry Into Online Relationships que traduzido fica algo como "um rápido inquérito sobre as relações online", mostrando uma das principais características dessa geração: a íntima e complexa relação com a tecnologia, especialmente com a internet. Partindo dessa premissa, o álbum irá discutir, criticar, refletir e explicar essas as relações humanas sob a luz do novo milênio em que tudo marchar na mesma velocidade da conexão. Um excepcional exemplo é a sensacional faixa The Man Who Married A Robot / Love Theme: uma estranha e fascinante história sobre um homem que se apaixonou pela internet. Além da produção original ao ser uma poesia declamada que foi musicalizada, a composição vai além da estranheza da história ao fazer uma certeira ao explicar sobre a solidão moderna em que as pessoas estão vinte e quatro horas conectados com o mundo todo, mas, na realidade, está completamente sozinho. A reflexão pode até ser profunda, mas o The 1975 apresenta outra característica fundamental: a leveza e inteligência que as letras são construídas.

Apesar de falarem sobre assuntos que poderiam sem nenhum problema precisar de um estofo dendo e complexo nas elaborações liricas, A Brief Inquiry Into Online Relationships vai na direção contrária ao apresentar uma atmosfera leve, sem grandes construções sintáticas e que nunca parece querer soar "inteligentão", transitando entre o divertido e o melancólico, passando pela doçura e a acidez e chegando ao despretensioso e o bem intencionado. Obviamente, essa sensação engana quem escuta as canções, pois por baixo da cala superfície existe uma redemoinho de mensagens que estão em plena explosão de sentidos que elevam as canções. It's Not Living (If It's Not With You), por exemplo, é uma leve e bonitinha canção sobre se apaixonar a primeira vista, mas, na verdade, fala sobre a dificuldade de se relacionar no mundo real depois de sentir a falsa realidade que a internet oferece. E mesmo que o álbum seja feito por e para os membros dessa geração millennial, a sonoridade de A Brief Inquiry Into Online Relationships tem ficado os dois pés em gerações passadas.

Assim como o álbum anteriorA Brief Inquiry Into Online Relationships é uma miscelânea de gêneros, influências e referências que constrói uma rica, multifacetada e elegante sonoridade que tem como ponto de partida principal o bom e velho pop. Partindo desse "marco zero", a produção do álbum que foi, pela primeira vez, comandado pelos próprios integrantes vai transitando e experimentando com o indie pop, pop rock, eletropop, experimental, R&B, dreampop, indie rock e alguns toques de folk. Além disso, a sonoridade ainda tem espaço para flertar com sonoridades dos anos oitenta e noventa, deixando o álbum ainda mais opulento sem precisar, porém, de soar demasiadamente exagerado ou mesmo presunçoso. Devido a essa característica não acredite que a produção faz do álbum uma bagunça sonora, pois cada canção tem uma personalidade única e distinta. Também não espere que o resultado final seja uma bagunça sonora sem nenhuma direção devido a quantidade de estilos e gêneros que o mesmo apresenta. O que acontece de verdade em A Brief Inquiry Into Online Relationships é de uma fluidez e coesão impressionante que ajuda a transformar o resultado final para um trabalho impecável, divertido, carismático e de uma elegância deslumbrante, criando uma dicotomia entre a sonoridade e a mensagem que as composições refletem. Isso colabora ainda mais para a sensação de grandiosidade e importância que o álbum parece querer passar, mas sem precisar impor essa sensação. Os melhores momentos do álbum ficam pela quase instrumental How To Draw / Petrichor, misturando dreampop come experimental, e a pegada indie rock/new wave da poderosa Love It If We Made It. Outros momentos de destaque fica pela delicada Be My Mistake, a pop soul/R&B Sincerity Is Scary, a indie rock/electropop Inside Your Mind que poderia ser uma canção do Coldplay, se os mesmo ainda fizessem boas canções, a lidinha balada jazz/indie pop Mine e a romântica com toques de gospel I Couldn't Be More In Love. Mesmo falando sobre uma determinada geração, A Brief Inquiry Into Online Relationships consegue expandir o seu público ao fazer o The 1975 entregar um dos melhores álbuns de 2018.

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